Detectives Selvagens 0 - Julho 2014 | Page 77

O HOMEM QUE UM DIA PAROU meio da praça, à vista de toda a gente sem ter cometido qualquer ilegalidade, a polícia e os bombeiros tentaram convencê-lo a ir para casa. Uma vez que Jorge Bonifácio não respondia através de comunicação verbal ou escrita, dada a sua imobilidade, foi estabelecido um sistema inicial de comunicação com base em piscadelas de olhos – uma para o sim, duas para o não e três ou mais em caso de poeira nos olhos. Assim se ficou a saber que Jorge Bonifácio estava bem, que não queria ajuda, nem sequer sair dali, recusando-se no entanto a dar qualquer explicação sobre as suas motivações. Perante o pranto de Maria do Carmo e da filha de ambos, Lurdes, que em 1987 tinha cerca de dez anos, há quem diga que Jorge terá vertido uma lágrima, permanecendo no entanto firme nas suas convicções, fossem elas quais fossem, permanecendo imóvel que nem uma pedra a quem tivessem atribuído olhos e a capacidade de respirar. E foi na força dessa imobilidade que começaram a detectar os primeiros sinais de que talvez Jorge Bonifácio não fosse apenas mais um apanhado do clima a quem lhe tivesse dado para aquilo. A verdade é que, passadas algumas semanas, e continuando Jorge imóvel na praça, a Junta de Freguesia viu-se a braços com um problema – as festas de São Julião estavam à porta e era na praça Simão dos Santos que normalmente eram montadas anualmente bancas e até um palco, para umas 77