MONSANTO – TRÊS FRAGMENTOS
completamente lisos, sem apoios para trepar. Também me
parecia pouco plausível que tivessem tido um percalço com
um preso voador, em tempos. Não, o mais provável é que
aquelas grades lá em cima tivessem como único objectivo
manter a coerência no estado de espírito do prisioneiro, não
fosse ele sentir-se um pouco melhor por ver uma extensão de
céu livre. Fiquei ali assim, de mãos nos bolsos do pijaminha
prisional, com as minhas pantufas a aquecer em cima das
lajes de pedra, semicerrando os olhos que lacrimejavam da
luz branca. A pouco e pouco os meus olhos habituaram-se à
claridade. A sombra rendilhada das grades no chão e nas
paredes dava a sensação de estarmos dentro de um cubo de
Rubik resolvido, uma face branca, quatro ocres e outra, um
puzzle do céu. O pátio era demasiado pequeno para se andar
para trás e para a frente em linha recta sem uma pessoa ficar
demasiado consciente de que estava encarcerada. Já tinha a
experiência da minha cela, eu, não era um estagiário. Então
comecei a andar aos círculos e de olhos quase fechados,
assim podia ter a ilusão de caminhar sempre em frente, em
liberdade. As grades no céu deram-me a impressão que,
mesmo morrendo, a minha alma não podia subir e libertar-se
dali. Tentei afastar a sensação de claustrofobia metafísica
andando mais rápido. Para não tropeçar, desc [