LOURENÇO BRAY
fomos pelo corredor. O guarda Neves batia com o bastão na
mão e assobiava o hino da alegria. O Barros espreitou da
guarita e sorriu maldosamente, depois escondeu-se outra vez
e ficou à espera, a fingir que não nos tinha visto. O guarda
murmurou 'agora é que vais ver' entre dentes e, depois de
carregar no botão de solicitação de abertura de portão,
ficámos os dois ali especados debaixo da luz vermelha
intermitente. O Barros saiu da guarita aos saltinhos e ia pedir
a senha-poema do dia quando o meu guarda lhe berrou:
─ Descalça vai para a fonte Lianor pela verdura; Vai
fermosa, e não segura. Leva na cabeça o pote, O testo nas
mãos de prata, Cinta de fina escarlata. Agora abre lá essa
merda.
O Barros estacou e todo o seu corpo se relaxou num
amuo desiludido. Abriu o portão. Fungou ao passarmos por
ele e limpou o nariz à manga do uniforme.
─ Não queres perguntar para onde o levo? ─ atirou-lhe
o meu guarda, muito bem disposto.
─ Quero lá saber. ─ resmungou o Barros, de mãos nos
bolsos, refugiando-se na guarita.
O guarda Neves, todo ele era felicidade em uniforme.
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