Detectives Selvagens 0 - Julho 2014 | Page 43

RUI o Tejo. Muita gente consideraria um privilégio, mas ele não. É-lhe indiferente. Estava farto do que ficava para lá do quarto. Tinha perdido o interesse pelo que havia lá fora. Era uma janela antiga com as portadas em madeira, também elas vincadas pelo passar dos dias e pela impiedade cega dos elementos. Novamente com o corpo virado para cima. Se levantar a cabeça, algo que não faz, consegue ver uma pequena estante que comprou para colocar os poucos livros que foi obtendo ao longo dos anos. Havia perdido muitos com o decorrer do tempo, mais do que os que agora tinha. Já não se lembrava porquê. Ou então, tinha feito por esquecer. A estante destoava de tudo o que havia naquele quarto. Era branca e de um material mais moderno. Tinha-a comprado numa loja de móveis que os vendia a um preço muito baixo. Nas prateleiras havia algumas fotografias. Não de pessoas, mas de locais e situações que lhe tinham agradado. Memória de um tempo em que lhe dava prazer imobilizar instantes. Também já não tinha a máquina de fotografar. Vendera-a há uns anos porque precisava de dinheiro. Senta-se na cama e acende um cigarro. Sentado na cama com os pés para fora. São cinco da tarde e hoje ainda não se havia levantado. Ao mesmo tempo que fuma, abre a gaveta da mesa-de-cabeceira e tira um pacote de bolachas. Sente fome. Come três. Sente-se um pouco melhor. Os últimos dias 43