Desfazer as confusões pd52 | Page 93

No país das meias-cidades! Sergio Magalhães A costumamo-nos a momentos de grande angústia quanto aos caminhos do Brasil. Somos tentados por soluções redento- ras, mas a volta do relógio mostra que não há mágica. Também apostamos que a grandeza do país impede a queda no abismo. Contudo, já perdemos muita energia. Questões funda- mentais permanecem sem equacionamento, para o qual precisa- mos de convergência democrática. A habitação é uma dessas questões fundamentais. Nas políti- cas ditas habitacionais, as más respostas vieram indistintamente de todos os espectros políticos, desde os anos 1930 – quando se identificou o problema da moradia popular entre nós. Tais políticas confundem moradia com habitação. A moradia é o domicílio de uma família. A habitação é a moradia, as redes de infraestrutura, o transporte, os equipamentos sociais e os serviços públicos. Simplificando: a moradia é individual, a habi- tação é social. Uma família pode prover sua moradia, ainda que com preca- riedade (e muita dificuldade). Mas a habitação, não; só a ação do coletivo. Se quisermos uma boa cidade, precisamos produzir habitação. Se não nos importarmos com a cidade e a cidadania, poderemos produzir apenas moradias. Todos os governos, desde meados do século passado, promove- ram moradias. Não trataram de política de habitação. Sob esse rótulo, fizeram política econômica para cuidar da indústria de materiais, das empreiteiras e do sistema financeiro, dizendo gerar empregos. Assim foi com o BNH, extinto nos anos 1980, até chegarmos ao Minha Casa Minha Vida (MCMV), igual em propó- sito e em desastre. Em quase um século, os recursos públicos e a poupança coletiva, somados, financiaram 20% dos domicílios construídos. Os demais 80%, quem financiou foi a própria família, na poupança tijolo a tijolo. 91