No país das meias-cidades!
Sergio Magalhães
A
costumamo-nos a momentos de grande angústia quanto aos
caminhos do Brasil. Somos tentados por soluções redento-
ras, mas a volta do relógio mostra que não há mágica.
Também apostamos que a grandeza do país impede a queda
no abismo. Contudo, já perdemos muita energia. Questões funda-
mentais permanecem sem equacionamento, para o qual precisa-
mos de convergência democrática.
A habitação é uma dessas questões fundamentais. Nas políti-
cas ditas habitacionais, as más respostas vieram indistintamente
de todos os espectros políticos, desde os anos 1930 – quando se
identificou o problema da moradia popular entre nós.
Tais políticas confundem moradia com habitação. A moradia é
o domicílio de uma família. A habitação é a moradia, as redes de
infraestrutura, o transporte, os equipamentos sociais e os serviços
públicos. Simplificando: a moradia é individual, a habi- tação é
social.
Uma família pode prover sua moradia, ainda que com preca-
riedade (e muita dificuldade). Mas a habitação, não; só a ação do
coletivo. Se quisermos uma boa cidade, precisamos produzir
habitação. Se não nos importarmos com a cidade e a cidadania,
poderemos produzir apenas moradias.
Todos os governos, desde meados do século passado, promove-
ram moradias. Não trataram de política de habitação. Sob esse
rótulo, fizeram política econômica para cuidar da indústria de
materiais, das empreiteiras e do sistema financeiro, dizendo gerar
empregos. Assim foi com o BNH, extinto nos anos 1980, até
chegarmos ao Minha Casa Minha Vida (MCMV), igual em propó-
sito e em desastre.
Em quase um século, os recursos públicos e a poupança
coletiva, somados, financiaram 20% dos domicílios construídos.
Os demais 80%, quem financiou foi a própria família, na
poupança tijolo a tijolo.
91