brasileiro. Muitos políticos atuais que, conscientemente ou não,
nela se referenciam, confiam a uma guardiania de procuradores
e juízes a faxina que um dia a UDN confiou a militares. É intui-
tivo imaginar em que tipo de dilema enreda-se o PSDB, já em
estado gasoso, quando se depara, entre outras realidades, com a
integração de Sergio Moro ao governo eleito.
É sob esse enquadramento, a um só tempo prudente e espe-
rançoso, que se retorna agora ao artigo de FHC.
Uma trilha possível
O radicalismo de centro pregado no artigo não converte em
centristas todos os que concordarem com o autor sobre a urgência
de que esse centro se constitua. A ideia de um radicalismo de
centro é certamente um achado capaz de orientar a formação de
uma oposição democrática e moderada ao governo que se insta-
lará em janeiro. O texto diferencia muito lucidamente essa ideia
de centro radical das de um centro amorfo e um "centrão". A essa
distinção poder-se-ia acrescentar outra: radicalismo de centro
que não se imagina ser sinônimo de extremismo de centro, o qual,
como todo extremismo, pretenderia a neutralização dos seus
"outros", as esquerdas e as direitas, dando à posição de centro a
pretensão de se tornar um pensamento único. Tal como, aliás,
discursou Getúlio Vargas, em 1937, ao instituir uma ditadura em
nome desse tipo de centro, quer dizer, do que ele afirmava ser um
"projeto nacional", remetendo ao exílio político ideologias por ele
proclamadas como "exóticas".
A razoabilidade do argumento do artigo é justamente propor
radicalidade como algo diferente e até oposto a extremismos, inclu-
sive os de centro. Demarca, pela crítica, diferenças em relação à
direita que venceu as eleições e à esquerda que recebeu um mandato
de oposição. Não nega esses polos, reconhece sua legitimidade mas
cuida de construir um discurso nítido e positivo do que seja um
centro despolarizador. Assim começa a dar substância à ideia gené-
rica, que dias antes ele mesmo manifestara, de se conduzir diante
do novo governo "sem adesismos nem negativismos". A vagueza
dessa fórmula insinuava uma neutralidade, o que não seria útil
nesse momento em que a construção de uma firme oposição demo-
crática é artigo de primeira necessidade, política e social.
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Paulo Fábio Dantas Neto