de todo o modo, ele reconhece que a memória do período 46/64 fez
da participação um tema central: apesar da excepcionalidade, a
experiência deixou marcas e não pode ser esquecida.
O argumento do autor é que a participação política não deriva
de forma simples do processo da transformação social. Condições
para que de um processo de mobilização social derive demanda
por participação da vida pública dependente de duas variáveis:
a primeira é a natureza do processo de modernização e de desen-
volvimento. Situações como a de vários países do ocidente em que
desenvolvimento econômico precede à modernização tendem a
gerar demandas específicas de classes e grupos sociais, com
ampliação progressiva da autonomia e da participação. Já onde a
modernização avança sem ser acompanhada no mesmo ritmo
pelo desenvolvimento econômico, a permanência de entraves de
desigualdade faz com que a ação política tenda a se fixar nos fins
mais que nos meios e assim a encorpar o nível simbólico e princi-
pista da vida política. Este segundo seria o nosso caso.
A segunda variável seriam as características mais próprias do
sistema político. Maior ou menor institucionalização podem
provocar permeabilidade ou rigidez perante novas demandas de
participação. E nesse ponto a formação e a configuração das
instituições brasileiras não favoreceriam. Começando pela origem
estatal de um sistema partidário hegemônico em que a coalizão
PSD/PTB ancora-se centralmente na cooptação e não na repre-
sentação. Essa coalizão sofria quatro tipos de oposição: a) oposi-
ção liberal a Vargas (UDN, setores médios urbanos, intelectuais,
lideranças arredadas); b) setores militares impacientes com a
ineficiência e o clientelismo, preços do sistema de cooptação;
c) setores operários que pressionavam lideranças sindicais por
mais militância e ideologia; d) setores militares, operários e inte-
lectuais nacionalistas, críticos da política externa. Para o autor,
todos eles, mesmo os mais inquietos, mantinham-se, até a crise
terminal do regime, às portas de 1964, nos marcos do que está
descrito, na literatura sobre o período, como um estado de compro-
misso, em que mudanças e avanços sociais eram possíveis desde
que não ultrapassassem certos limites para além dos quais a
democracia poderia abrir brechas à subversão da ordem.
A política de cooptação transitava, conforme Schwartzman,
num continuum esquerda/direita, entre situação e oposições e
focava em demandas voltadas ao Estado. Nova dimensão se mostra
à medida em que se aproximam os anos de 1960. É a intensidade
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Paulo Fábio Dantas Neto