A gramática da política contra
o pathos profético 1
Paulo Fábio Dantas Neto
O
atual momento político propicia que, em ambientes univer-
sitários, se exercite uma atividade daquelas que melhor
demonstram a razão de ser de instituições universitá-
rias. Travar um debate de sentido político, portanto, opinativo, a
partir de esforços intelectuais que adotem a isenção (embora não
a neutralidade) como método para que debatedores se entendam
sobre uma base factual comum, dando-se, a partir dela, a livre
discussão das opiniões.
Em momentos críticos, essa situação amigável, em que possam
fluir simultaneamente e sem peias a dignidade da ciência e da
política, não se estabelece naturalmente apenas porque se está
numa universidade. Elas, como todos os ambientes sociais,
expõem-se a azares de uma situação em que a regra é assassinar
fatos para promover narrativas. Essa prática, se prevalece, pode
ser letal à vida universitária pelo seu potencial de converter
aquela situação amigável em impossibilidade prática. Nessa hipó-
tese torna-se duvidosa a própria razão de ser dessas instituições,
pois fazer política às custas da ciência é algo tão obscurantista
quanto querer anular a política através da ciência.
A natureza dos recursos intelectuais que, por ofício, se
maneja nas universidades públicas, em condições de autonomia
política e administrativa e de estabilidade funcional, faz com
que ali as possibilidades extremas de se fazer de um dissenso
fator de obscurantismo ou de iluminação sejam uma escolha.
Em conjunturas críticas é prerrogativa de poucos. Componentes
dessas instituições que escolhem buscar interlocução que
ilumine o ambiente interno e contribua ao esclarecimento do
ambiente social estão desafiados a praticar a tolerância desde a
fixação de um tema para discussão. Podem ter de ir ao debate
sem consenso inicial sobre uma base factual comum, tendo
mesmo que discutir em público sobre realidades virtuais,
havendo um virtual para cada qual. Isso porque o acesso da
1 Com exceção do preâmbulo, o texto corresponde a uma exposição oral num
debate na UFBA, no dia 09/11/2018.
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