Desfazer as confusões pd52 | Page 28

(Nova República, 1990-2018 1 ) – comprimia e arbitrava a disputa política em prol de seus interesses vitais, como elite político-buro- crática, e de suas conexões com as classes fundamentais (domi- nantes e dominadas), de modo tal que nem as semirrupturas do Estado Novo e da Contrarrevolução de 1964 foram capazes de superá-la, em meio à conformação de novos blocos históricos, depois de esgotados os instrumentos de subordinação explicita- mente autoritária da sociedade civil ao Estado. Desnecessário dizer que tal presidencialismo de cooptação, de inspiração liberal, foi, desde sempre, responsável tanto pela manu- tenção do déficit crônico de democracia e estabilidade ao longo da República (vide A democratização do Estado), como de racionali- dade burocrática – à exceção dos períodos de semirrupturas mencionados –, visto seu compromisso figadal com os privilégios corporativos encerrados em sua própria constituição de classe e o modo como tendia, e tende, a traduzir o interesse como privilégio – o posto do imperativo funcional de qualquer sociedade moderna. Por isso, ela foi e segue sendo fator de instabilidade política, não só por tirar proveito das distorções institucionais que dificul- tam a representação política (vide Accountability e Reforma Polí- tica), mas porque administra seu domínio do Estado e, através dele, sobre a sociedade, por meio do uso abusivo de recursos públicos (orçamentários e institucionais) – seja pela corrupção, pelo desvio de função ou perversão das políticas públicas – que produzem falsos consensos ao custo do desperdício do cresci- mento econômico, obstaculizando o verdadeiro desenvolvimento. Não foi por outro motivo que o modelo neopatrimonial de domi- nação entrou em crise seguidamente quando diante de crises recessivo-inflacionárias, levando a radicalizações políticas, como em 1930 e 1964, quando a capacidade estatal de amortecimento dos conflitos sociais, via cooptação, diminuiu drasticamente. É precisamente isto que vivenciamos agora, com o colapso da direção social-patrimonial sobre o bloco histórico (vide “Os peri- gos que se avizinham e o antídoto” e “O Brasil que emerge das urnas”), quando a brutal recessão do período petista (Dilma) se encontra com o esgotamento ético e fiscal do modelo de inclusão 1 26 Que se inaugura politicamente com a volta dos civis ao poder (Tancredo-Sarney) em 1985, mas cuja expressão acabada é o bloco histórico liberal-financista inau- gurado por Collor (1990-1992), e depois estabilizado por FHC (1995-2002) e alargado por Lils (2003-2016). Hamilton Garcia de Lima