mento operário e do país – uma história desde baixo, movida por um
partido que se concebe como expressão pura do social “contra a
mediação representada pelas formas elitistas da política” (p. 45).
O título Que esquerda é esta? dialoga, então, com a ambiva-
lência do PT em relação às instituições da democracia política e
às mudanças processuais, incrementais, que podem advir do
alargamento da base de massas do Estado democrático de direito.
Para o autor, essa ambivalência e suas consequências práticas
trazem riscos de retrocesso político, mesmo quando encarnada –
ou até por isso – num novo cavaleiro da esperança.
Já em 2018, “quando os sinais de alarme soam com estridên-
cia” (p. 291) anunciando a crise da democracia política tal como
até então a conhecíamos, Luiz Sérgio arrola os traços dessa dinâ-
mica em curso no mundo. Destaque-se, nesse passo, a perspec-
tiva cosmopolita do autor, que atenua o provincianismo dos deba-
tes locais e situa nossas aflições brasileiras num mundo em
profunda mutação. A eleição de Donald Trump, em 2016, é um
desses traços, evidenciando a corrosão da coesão social norte-a-
mericana e a produção de um padrão de enfrentamento político
que interrompe o processo de fortalecimento contínuo de pautas
ambientais e de gênero, com impacto planetário.
Na Europa, os problemas não são menores; e mesmo a Itália,
“de rica tradição de esquerda” (p. 292), conhece a emergência
majoritária da extrema direita, perante a qual o próprio Silvio
Berlusconi pode ser tomado como um exemplo de moderação.
Mas é na América do Sul que as democracias constitucionais
se encontram em avançado estado de degradação. O abandono da
ideia de centro político; a aposta na contraposição entre povo e
elites – essas elites compreendendo as “reacionárias classes
médias”; a tentativa de se perpetuar no poder, cometendo, para
isso, os métodos da burla marqueteira, da cooptação, da demoni-
zação dos adversários, para não mencionar a corrupção em escala
transnacional, são algumas práticas que ali têm curso.
Na Bolívia, lembra o autor, contra o veredicto formal de um
plebiscito, a manutenção do mesmo mandatário foi justificada pelo
respeito que ele devota aos direitos humanos. E a crise humanitá-
ria na Venezuela é uma tragédia que desonra todas as esquerdas.
Portanto, não serão a divisão e o confronto que poderão rein-
ventar a democracia política no subcontinente, o Brasil incluído.
192
Maria Alice Rezende de Carvalho