Desfazer as confusões pd52 | Page 172

Em seu livro O sonho é realidade (Omni, 2016), Galba Gomes viaja no tempo e retorna à sua fase de estudante de Odontologia da Universidade Federal do Ceará. Testemunha ocular e personagem enquanto líder estudantil em Fortaleza, ele informa que: 1968 começou com grandes passeatas, acirradas pela divisão das tendências já referidas. Aconteceram grandes manifesta- ções: a passeata dos Cem Mil no Rio de Janeiro, no dia 26 de março, e a passeata dos Vinte Mil, em Fortaleza, que bem caracteriza ser Fortaleza, naquele período, a cidade na região Nordeste de capacidade de mobilização mais intensa e uma das mais significativas no Brasil. Foi no Rio, durante uma dessas manifestações, no dia 28 de março de 1968, que o secundarista Edson Luís de Lima Souto foi morto a tiros pela polícia. As ruas regurgitavam de estudan- tes. A repressão se processava e repercutia de forma rápida e violenta em todo o Brasil. o0o Mil novecentos e sessenta e oito foi um ano avassalador. No Brasil, ele inaugurou um ciclo sombrio que vai se aprofundando até levar à exaustão a ditadura militar instalada em 1964. 1969 mostrou que o que era sombrio poderia ficar bem mais tenebrosa- mente escuro. A adequada expressão de Élio Gaspari, “a ditadura escancarada” 21 mostra o acirramento de uma ruptura institucio- nal que começou prometendo eleições gerais dois anos depois — após arrumar a casa e afastar a “ameaça comunista”. O que vimos foi uma escalada de violência e a reação de estudantes que sonhavam com a “ditadura do proletariado”. O ciclo militar de 1964 precisa ser recontado à exaustão. Uma ditadura que começa como um “experimento” para afastar a “ameaça comunista”, com o apoio da classe média, de intelectuais e da imprensa mostra que não se pode pactuar com quem tem o poder das armas de fogo. A ilusão dos apoiadores logo se dizimou, foi-se pulverizando a cada avanço do gosto militar pela nova ordem, a despeito de correlações de forças no âmbito do generalato. Prevaleceu a linha dura. noticias/2018/03/25/1968-foimuito-ruim-diz-historiador-carlos-fico>. Acesso em: 01/08/2018. 170 Luis-Sérgio Santos