Movido pela alta temperatura dos últimos acontecimentos, da
tribuna da Câmara, bradou Márcio Moreira Alves:
[...] As cúpulas militaristas procuram explorar o sentimento
profundo de patriotismo do povo e pedirão aos colégios que
desfilem junto com os algozes dos estudantes. Seria necessá-
rio que cada pai, cada mãe, se compenetrasse de que a
presença dos seus filhos nesse desfile é o auxílio aos carras- cos
que os espancam e os metralham nas ruas. Portanto, que cada
um boicote esse desfile.
Esse boicote pode passar também, sempre falando de mulhe-
res, às moças. Aquelas que dançam com cadetes e namoram jovens
oficiais. Seria preciso fazer hoje, no Brasil, que as mulheres de
1968 repetissem as paulistas da Guerra dos Emboabas e recusas-
sem a entrada à porta de sua casa àqueles que as vilipendiam.
[...] Discordar em silêncio, pouco adianta. Necessário se torna
agir contra os que abusam das forças armadas, falando e
agindo em seu nome. 6
Esse discurso teria sido a gota d’água para a decretação do AI-
5.
Colega de Márcio, inclusive no jornalismo, o deputado do MDB,
o jornalista Hermano Alves, publicou uma série de artigos no
jornal Correio da Manhã – onde escrevia regularmente – vistos
pelos militares como provocações.
O Correio da Manhã era um dos jornais mais influentes
naquela conjuntura com profissionais de peso em suas páginas
como Márcio, Hermano, Edmundo Moniz e Carlos Heitor Cony.
Para Cony, Hermano era “generoso e brilhante”, como publicou
em sua coluna “O ato e o fato”, de 14 de julho de 1964, no Correio.
Devido às “ofensas e provocações irresponsáveis e intoleráveis”
o governo pediu ao Congresso a cassação dos dois deputados.
O pedido foi à votação em plenário e perdeu com uma diferença de
75 votos.
No dia seguinte, foi anunciado o AI-5, que dava poderes excep-
cionais ao Presidente da República. Ele poderia decretar o recesso
do Congresso Nacional; intervir nos estados e municípios; cassar
6
O vídeo do discurso do deputado federal Márcio Moreira Alves (1936-2009) está
disponível em: . Acesso
em: 01/08/2018.
1968, o ano que mudou o mundo
167