Desfazer as confusões pd52 | Page 139

certo, podem existir situações fáticas em que não há violência física ou psicológica efetiva quando alguém mantém relações sexuais com um menor de 14 anos – aliás, assim já decidiu o próprio STF no famoso julgamento do HC nº 73.662, relatado pelo ministro Marco Aurélio – mas, pragmaticamente, diante das difi- culdades de se averiguar a questão do consentimento efetivo e real em casos concretos e ante a relevância do bem jurídico tute- lado, o legislador optou por presumir a violência e por antecipar a toda a coletividade a repulsa da conduta e a ação que irá tomar. A ideia de Witzel, assim, de adiantar como as forças de segu- rança agirão diante de uma situação em que flagram um crimi- noso portando uma metralhadora, não é estranha ao direito e pode ser considerada uma medida “objetivamente razoável”, se levados em conta (a) a letalidade da arma, (b) a circunstância de se tratar de ato que a lei penal brasileira qualifica como crime hediondo, (c) os graves riscos às forças de segurança e a tercei- ros que estejam próximos do local, (d) a inexistência de outro meio mais seguro de efetivar o cumprimento da lei e efetuar a prisão do criminoso, bem como (e) o histórico de mortes por balas perdidas no Rio de Janeiro. Alegações de que esse procedi- mento reflete ineficiência da corporação, pois a polícia deveria ser capaz de prender o criminoso, são desconectadas da reali- dade. Pode-se até numa análise posterior de um caso específico concluir, a partir de uma “visão 20/20 em retrospectiva”, que um determinado criminoso nessas circunstâncias poderia não oferecer enorme risco – talvez por não ser uma pessoa perigosa, que apenas portava a metralhadora para assustar –, mas é incontroverso que o julgamento de um policial que, numa fração de segundo, opta por abatê-lo, num critério objetivo de razoabi- lidade, pode ser justificado, ainda que posteriormente seja consi- derado incorreto, pois ele dificilmente terá todas essas informa- ções no momento da tomada de decisão. A proposta de Witzel tem assim uma enorme virtude: a de, diante das dificuldades concretas de se atuar convencionalmente prendendo o criminoso, já adiantar uma norma de conduta clara e inequívoca de atuação das forças de segurança segundo a qual as pessoas não podem carregar armamentos de uso restrito, pois qualquer pessoa objetivamente razoável pressupõe que se trate de um criminoso hediondo, de enorme periculosidade, que oferece perigo real e iminente não só ao policial presente ao confronto, Atiradores de elite e o Direito 137