rem portando armas de uso restrito de forças armadas. Logo, o
governador não defende o target killing, mas a eliminação de
pessoas que, na visão dele, constituem um perigo real e iminente
pelo mero fato de serem flagradas portando uma arma de tamanha
letalidade. Se, de fato, for essa a proposta de Witzel, a crítica do
sociólogo Ignácio Cano antes mencionada não parece correta.
Se examinada a compatibilidade da proposta com o direito
brasileiro, à luz dos critérios definidos pela Suprema Corte ameri-
cana, é seguro afirmar que a proposição do governador eleito difi-
cilmente seria considerada inconstitucional. No Brasil, metralha-
doras e rifles automáticos são armas de uso restrito das forças
armadas. A posse ou o porte ilegal desse tipo de arma, pelos
termos da Lei nº 13.497/2017, tanto na forma tentada quanto
consumada, é considerada crime hediondo. O fato de um crimi-
noso portar uma arma dessa natureza é, então, qualificado como
um crime gravíssimo pela nossa legislação, justamente porque se
sabe das consequências que podem advir. Em que pese o indiví-
duo poder ser flagrado sem estar numa posição de ataque, é certo
que, numa fração de segundo, a sua atitude pode se modificar e
ele pode passar a disparar a arma. Um fuzil AK-47, um dos tipos
de arma que foram contrabandeadas para o Rio de Janeiro por
Frederik Barbieri, o maior contrabandista de armas do país, preso
em Miami no início do ano, por exemplo, dispara quase 600 tiros
por minuto no modo automático. Mesmo balas atiradas para o
alto, quando retornam à superfície, podem matar. Daí a razão
desses disparos serem considerados crime inafiançável no Brasil.
Exigir que um policial que flagre um bandido usando uma arma
dessas aguarde o início de uma agressão para poder atirar e se
defender é algo absolutamente irreal, pois as chances de ele sair
vivo desse embate são mínimas.
Mesmo se avaliada à luz dos Princípios Básicos de Uso de
Força e Armas por Forças de Aplicação da Lei, adotados por
consenso, por ocasião do Oitavo Congresso das Nações Unidas
sobre Prevenção do Crime e Tratamento dos Delinquentes, reali-
zado em 7 de setembro de 1990, a proposta de Witzel não seria
vedada. Segundo o princípio nº 10, os policiais podem se abster de
comunicar a intenção de recorrer ao uso de armas de fogo a crimi-
nosos se tal procedimento representar “um risco indevido para os
responsáveis pela aplicação da lei ou acarretar para outrem um
risco de morte ou dano grave, ou seja claramente inadequado ou
inútil dadas as circunstâncias do caso”.
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Flávio Jardim