Desfazer as confusões pd52 | Page 130

Atiradores de elite e o Direito Flávio Jardim A s declarações do governador eleito do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, dadas num programa da Globo News, em 30 de outubro último, tiveram grande repercussão. Witzel defen- deu o abatimento de criminosos que estiverem portando armas de uso exclusivo das forças armadas por atiradores de elite. Ao explicar o seu ponto de vista, ele afirmou que a mera circuns- tância de uma pessoa portar uma arma de tamanha letalidade já representa uma “ameaça”. O ex-juiz argumentou a pertinência dessa qualificação mesmo no cenário hipotético apresentado pela jornalista Maria Beltrão, em que o criminoso estaria de costas para o policial. Ele explicou que, na sua visão, “se o [criminoso] não for abatido, ele utilizará o fuzil para matar quem quer que seja”. Witzel complementou que a autorização para eliminar o indivíduo será dada exclusivamente a atiradores com treinamento específico e por especialistas que definirão as estratégias a serem adotadas nas operações de combate. A ideia de que policiais possam sair do quartel previamente autorizados a abater cidadãos, ainda que flagrados portando fuzis, gerou grande controvérsia. Os demais participantes do programa da Globo News pareceram não concordar com a posição de Witzel e tentaram, sem sucesso, demovê-lo da proposta. Especialistas ouvi- dos por diversos veículos de mídia também rejeitaram a sugestão. Ao O Estado de S . Paulo, o sociólogo Ignácio Cano, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, asseverou que “a noção de atirar e matar alguém que está de posse de uma arma ilegal significa rasgar a Constituição, que só prevê pena de morte em tempos de guerra, e rasgar tratados internacionais que o Brasil assinou”. Segundo ele, Witzel tenta trazer para a segurança pública uma doutrina militar: “basta identificar alguém como um combatente inimigo para matá-lo”. A professora de Direito Penal da FGV, Maíra Zapater, entrevistada pelo site da revista Carta Capital, salientou que a proposta de “abate” representa uma “ilegalidade flagrante”. Na visão dela, “o que [Witzel] está chamando de ‘abater pessoas’ [se] chama homicídio”. Já o ministro da Segurança Pública, Raul Jung- 128