Afinal, a ordem escravista não dava aos escravos rebelados
aquelas condições mínimas para abatê-lo. Isto é, a realização de
uma política de alianças que fosse além do próprio estamento
escravista, submetido, de outra parte, a constantes renovações de
natureza demográfica, devido à curta duração do ciclo de vida do
escravo. Ora, isso dificultava sobremaneira a formação de uma
memória de classe. A transmissão indispensável de experiências.
Além do que, os próprios escravos se dividiam entre trabalha-
dores produtivos – que operavam nos engenhos e no corte da cana-
de-açúcar – e trabalhadores domésticos. Isso, para não aludirmos
aos diferentes horizontes étnicos e culturais presentes no Quilombo.
Nele, uma mulher, Acotirene, chegou a dirigir um quilombo.
De toda forma, Zumbi e seus companheiros nos deixaram
uma grande lição: criaram um Brasil não oficial, em contraposi-
ção ao Brasil oficial, um projeto estatal português, sem dúvida.
Em Palmares, surgia uma nação chamada Brasil, ainda que às
avessas. E, ainda hoje, a luta desses homens ecoa, forçando em
todos nós um justo sentimento de admiração.
Um grande dirigente revolucionário do nosso tempo observou,
certa feita, que “um chefe militar não pode esperar arrancar uma
vitória indo além dos limites impostos pelas condições materiais,
mas ele pode e deve lutar pela vitória nos limites mesmos dessas
condições. O cenário onde se desenrolam suas atividades repousa
sobre condições materiais objetivas, mas ele pode, sobre este
cenário, conduzir ações magníficas, de uma grandeza épica”.
Zumbi, enquanto chefe militar, parece ter compreendido isso.
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Ivan Alves Filho