Desfazer as confusões pd52 | Page 122

Afinal, a ordem escravista não dava aos escravos rebelados aquelas condições mínimas para abatê-lo. Isto é, a realização de uma política de alianças que fosse além do próprio estamento escravista, submetido, de outra parte, a constantes renovações de natureza demográfica, devido à curta duração do ciclo de vida do escravo. Ora, isso dificultava sobremaneira a formação de uma memória de classe. A transmissão indispensável de experiências. Além do que, os próprios escravos se dividiam entre trabalha- dores produtivos – que operavam nos engenhos e no corte da cana- de-açúcar – e trabalhadores domésticos. Isso, para não aludirmos aos diferentes horizontes étnicos e culturais presentes no Quilombo. Nele, uma mulher, Acotirene, chegou a dirigir um quilombo. De toda forma, Zumbi e seus companheiros nos deixaram uma grande lição: criaram um Brasil não oficial, em contraposi- ção ao Brasil oficial, um projeto estatal português, sem dúvida. Em Palmares, surgia uma nação chamada Brasil, ainda que às avessas. E, ainda hoje, a luta desses homens ecoa, forçando em todos nós um justo sentimento de admiração. Um grande dirigente revolucionário do nosso tempo observou, certa feita, que “um chefe militar não pode esperar arrancar uma vitória indo além dos limites impostos pelas condições materiais, mas ele pode e deve lutar pela vitória nos limites mesmos dessas condições. O cenário onde se desenrolam suas atividades repousa sobre condições materiais objetivas, mas ele pode, sobre este cenário, conduzir ações magníficas, de uma grandeza épica”. Zumbi, enquanto chefe militar, parece ter compreendido isso. 120 Ivan Alves Filho