Contemporânea Contemporânea #8 | Page 27

sempre de branco. Pareciam-me mulheres fortes, decididas, competentes, algo que sempre desejei me tornar.

No reino masculino, confesso, era apaixonada por Peter Sampras. Achava-o lindo e uma garota da minha idade tinha seus ídolos. Os nomes Wimbledon e Roland Garros eram de um outro mundo com o qual eu sonhava e longe estavam de minha realidade social. Eu imaginava a Europa. As pessoas elegantes, de chapéu, que assistiam aos jogos, eu admirava. Conhecia Sergi Bruguera e Andre Agassi, este último, talvez, por usar cabelos revoltos (hoje está muito mais charmoso sem cabelos) prenunciava adoração que teríamos com outra cabeleira, mas manezinha da Ilha.

Eu já sabia que queria muito estudar, mas não vislumbrava naquele momento, nem por um segundo, a possibilidade de morar na capital do estado, cidade de Gustavo Kuerten, e frequentar a UFSC, local no qual há várias quadras de tênis e onde mais tarde pude finalmente experimentar o esporte. Antes, fui hipnotizada pelo garoto da Ilha, em uma final, digna dos domingos em que Ayrton Senna parava o Brasil.

Lembro que estava em casa, sozinha. Do contrário, não poderia assistir à televisão, pois havia apenas um aparelho e as crianças não comandavam a programação. Por sorte, eu sou a mais velha, “mandava” mais e como todo domingo meu pai tinha campeonatos de futebol para arbitrar, eu podia desfrutar da televisão apenas para mim. Assisti à final na Rede Bandeirantes, que naquele momento intitulava-se “O canal do esporte”. A Rede Globo de Televisão também se renderia ao manezinho mais famoso, mas, então, o tênis era produto exclusivo da primeira. Sempre transmitindo jogos com atletas estrangeiros, naquele ano foi brindada com o inusitado sucesso do 66˚ do mundo, que com uma arrasadora esquerda pulou para 15ª, a melhor posição que um brasileiro até então havia atingido no ranking – mundial – da ATP (Associação dos Tenistas Profissionais).

As semanas que anteciparam a final foram de inusitadas para enlouquecedoras. Um garoto de 20 anos, magrelo, usando roupas coloridas, aparentemente desengonçado, que não havia até então vencido qualquer torneio da ATP, vinha ganhando e deixando para trás muitos dos maiores nomes da época, entre eles, Sergi Bruguera e Yevgeny Kafelnikov, algo completamente impensável. A mídia do Brasil e do mundo assistia, atônita, ao moleque derrotar, um a um, a todos os adversários. Os jogos, por vezes no horário da tarde, eu não podia assistir, já que a escola era uma obrigação, quase um culto, e faltar para assistir televisão era, e talvez ainda seja, pouco menos que uma heresia. Eu tinha de esperar, sentada no canto da sala, meu pai assistir ao Jornal Nacional, noticiário noturno carro-chefe da Rede Globo, para só então descobrir que Gustavo havia vencido mais uma. Alegria parecida só vivenciava quando recebia, a cada quatro anos, uma tabela com os jogos da Copa do Mundo de Futebol, e, vibrando com as vitórias do Brasil, preenchia-a apostando com minha irmã do meio os placares e resultados dos jogos entre outros países.

Naquele domingo, como sempre acontece quando o time de futebol de minha devoção tem uma partida importante, o nervosismo me possuía. Jovem ainda, descobri como o esporte já tinha radicação total em mim, fosse pelo impacto estético que me tomava, fosse pela paixão que me despertava, fosse ainda o objeto de pesquisa que me acompanha desde sempre na vida acadêmica.

Guga entrou na quadra, sim Guga, porque naquele momento ele já era íntimo, não era mais Gustavo. Todos diziam que chegar à final já era vencer, mas, ele, eu e imagino

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