Contemporânea Contemporânea #7 | Page 10

Morre Zygmunt Bauman, o pensador da liquidez

Felipe Quintão de Almeida

No dia 09 de janeiro de 2017 veículos de comunicação do mundo inteiro, como BBC News, The Guardian, Al Jazeera, The Washington Post, noticiaram o falecimento do sociólogo Zygmunt Bauman. A Bristish Sociological Association e o Bauman Institute comentaram, com pesar, o falecimento desse “grande estudioso”. No Brasil, a notícia de sua “partida” também foi comentada pelos grandes jornais, como a Folha de São Paulo, e destacada na página principal da Sociedade Brasileira de Sociologia.

A repercussão de sua morte é indício da importância e visibilidade alcançada pelas ideias do sociólogo mundo afora. Para muitos, o “profeta da pós-modernidade”, um “intelectual pop da atualidade”, uma “grife da Sociologia na virada do século”. Para outros, um autor que não deixou um legado da envergadura de Hegel, Marx ou Weber, mas que nos ajudou, como poucos, a entender o mundo contemporâneo numa linguagem “generosa” e “acessível”.

Autor de 57 livros e de dezenas de artigos publicados em renomadas revistas, o trabalho de Bauman tornou-se mais conhecido, no Brasil, na década de 2000, especialmente a partir da tradução para o português daquilo que alguns comentadores denominaram de “trilogia”, composta pelos livros Modernidade e Holocausto, Modernidade e Ambivalência e Legisladores e intérpretes: sobre a modernidade, a pós-modernidade e os intelectuais, publicados originalmente entre os anos 1987 e 1991. Pelo primeiro, aliás, recebeu o Prêmio Amalfi em 1989, nove anos antes de receber o não menos prestigioso Prêmio Adorno, pelo conjunto de sua obra.

O “conjunto da obra” incluía, além dos três livros apenas citados, todos aqueles que o autor vinha

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publicando desde os anos 1960, uma literatura, diga-se de passagem, relativamente desconhecida do público brasileiro. Os leitores se surpreenderiam se realizassem o exercício de comparar as obras daquela época, algumas das quais escritas em polonês e fortemente influenciadas pela “teoria marxista”, com aquelas que o tornaram um sociólogo globalmente (re)conhecido.

Sabemos, todavia, que a história de um autor é, em grande medida, a história de sua recepção. No Brasil, mas também em outras partes do globo, o Bauman que “pegou” com mais força foi aquele que, inspirado numa conhecida frase do Manifesto Comunista (“Tudo o que era sólido se desmancha no ar”), criou as metáforas da “solidez” e da “liquidez” para pensar o contemporâneo em suas múltiplas faces. Os conceitos de “modernidade sólida” e “modernidade líquida” apareceram pela primeira vez em Modernidade líquida, cujo original, em inglês, é de 2000. Tais conceitos foram empregados, quase à exaustão, nos livros subsequentes, o que, inclusive, rendeu algumas críticas ao sociólogo.

Uma delas é a de que esses livros são, todos, “variações do mesmo tema”. Como exemplos, entre tantos outros, Amor líquido, Vida líquida e Tempos líquidos. Não importando o tema, a chave de leitura empregada é a mesma para se discutir a liquidez que, na sua analítica, é a principal marca do mundo contemporâneo. A editora Jorge Zahar, que publicou trinta e oito livros do sociólogo, soube aproveitar e estimular o sucesso de Bauman no Brasil, transformando-o num

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