CineBA Volume 1 | Page 31

Na Igreja do Passo, de costas para o altar, o cineasta Sergio Machado fala da identidade visual de sua obra. Pouco à vontade no ambiente religioso, ele o deixa e vai em direção às escadarias que ficam em frente ao lugar. Sentado, reflete sobre os caminhos que o levaram até a sétima arte.

Quando muito jovem, Sergio fez um intercâmbio estudantil até a Índia. Desde então, ingressou na universidade, depois no mercado cinematográfico profissional e teve a oportunidade de visitar diversos lugares por conta de seu trabalho (nas semanas que antecederam seu retorno a Salvador, esteve gravando em Miami, México, Liverpool e Cannes), mas nada tão marcante quanto a Índia vista por seus olhos de garoto.

Da experiência Sergio Machado levou a lembrança das belas paisagens, a delicadeza do povo, uma nova conexão com a espiritualidade e um pequeno documentário chamado “Três canções indianas”.

Sem ter vivido uma crise vocacional, o baiano estava convicto de que queria se profissionalizar como cineasta. Restava descobrir como. Diante da escassez de opções, cursou jornalismo. O média-metragem de terror “Troca de cabeças”, seu trabalho de conclusão de curso, acabou por ganhar certa popularidade. A obra que tem a última participação de Grande Otelo no cinema abriria muitas portas.

Formado, mas sem perspectiva alguma de seguir fazendo o que gostava no período que ficaria marcado como a pior época do cinema brasileiro, Sergio Machado recebeu uma ligação de Jorge Amado. Ele tinha visto “Troca de cabeças” e não só havia gostado como também queria ajudar na carreira do rapaz de alguma forma. Através do escritor, uma cópia do média-metragem chegou até o diretor Walter Salles que convidou Sérgio para trabalhar no seu próximo filme.

Durante seu primeiro dia de trabalho, ele pôde presenciar uma cena de Fernanda Montenegro e Marília Pêra. Ainda sem ter a dimensão do que estava participando, ele já dizia que o filme ganharia o mundo. Muitos entenderam a empolgação apenas como delírio de um iniciante. Naqueles estúdios estava sendo produzido “Central do Brasil”, filme de aclamação universal que rendeu até mesmo indicações ao Oscar.

Hoje, não por coincidência, seu filho se chama Jorge, que tem como padrinho Walter Salles — com quem Sérgio já repetiu a parceria profissional diversas vezes.

A Bahia exerce uma grande influência em seus trabalhos, mesmo que tenha sido necessário ter que deixá-la para viver do que ama. Mas muitos os atores e cenários do estado que podem ser vistos em seus filmes. É aqui onde o cineasta mais se sente à vontade, é aqui onde escreve todos os seus roteiros. “Eu posso estar longe da Bahia, mas ela está sempre perto de mim”, Conclui Sérgio Machado, descendo a escadaria.

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