Catálogo Cine FAP Western | Page 10

Trechos de : “ Vera Cruz ( 1954 )”, por Fábio Luis Rockenbach Íntegra : https :// revistamoviement . net / 43-vera-cruz-1954-7eac36c98774 Se pudéssemos imaginar uma linha do tempo do western , ela seria cortada por lacunas separando as principais fases do gênero : o período mudo , o período clássico , a era dos metawesterns , os revisionistas e os contemporâneos . Ali , junto dos revisionistas , haveria uma curva levando ao western europeu , ou spaghetti . Seria possível , também , inserir alguns cineastas nessas lacunas , como responsáveis pela transição de um período a outro . Ford , na primeira das lacunas , Anthony Mann na segunda , Peckinpah na penúltima e Costner lá no final , ao lado de Eastwood . E também haveria uma segunda curva incluindo , obviamente , Leone .
Esses são diretores essenciais e habitualmente reconhecidos como responsáveis , em parte ou no todo , pelas transformações formais e temáticas do gênero . Há , porém , um nome que passa despercebido , e está perdido entre Peckinpah e Leone . Ele surge um pouco antes , e de certa forma antevê características que surgiriam pouco depois do outro lado do oceano . Robert Aldrich , que pese não ser reconhecido por isso , já introduzia , nos anos 50 , elementos - principalmente narrativos - dos westerns spaghetti e Vera Cruz é um de seus mais bem acabados exemplares dessa espécie de transição prévia .
Em Vera Cruz , tudo gira em torno da relação simbiótica e ambígua entre dois americanos que , após a guerra civil americana , rumam para o sul e transitam , como tantos outros , na fronteira com o México , envolvendo-se com o imperador Maximiliano e os rebeldes opositores . Há um óbvio subtexto envolvendo o papel dos Estados Unidos nessa balança desequilibrada , e , claro , há óbvios maniqueísmos narrativos na concepção desses dois lados , do despotismo oficial ao caráter libertário dos rebeldes , mas Vera Cruz é , sobretudo , uma trama que depende de uma situação banal : dois homens que convivem entre a amizade , a admiração , a competição e a fronteira entre a fidelidade e a traição . Gary Cooper e Burt Lancaster encaram esses dois lados , o primeiro como um soldado que , derrotado na guerra , busca oportunidades de enriquecer na fronteira sul , enquanto sustenta um código moral óbvio , mesmo que aos seus pares possa parecer outro soldado da fortuna . Já Lancaster incorpora um fora da lei sorridente e inculto , temido por todos , mas constantemente lidando com a traição de seus pares e a busca por fortuna .
Aí , nem mesmo os diálogos expositivos - ás vezes irritantemente expositivos - conseguem atrapalhar . O que emerge é a velha capacidade de Aldrich nos absorver num cinema regido pelo movimento e pela sucessão de episódios em torno de personagens carismáticos . O homem , como prova sua filmografia , era mestre nisso , e merecia ser mais reconhecido hoje .