As ruas e a democracia. Ensaios sobre o Brasil contemporâneo | Page 84

não querem reformar para valer. Votariam “não” por temerem que o Congresso direcione o fórum em sentido reacionário. E na 3, ficariam em dúvida aqueles que querem a reeleição de Dilma e votariam “não” os que querem que as coisas só mudem em 2018. Tanto na pergunta 2, quanto na 3, algum detalhamento seria indispensável, na linha, por exemplo, de esclarecer como seriam organizados os fóruns de discussão no Congresso ou ajustados os prazos regimentais. Desse modo, o plebiscito não faria perguntas mais diretas, referentes a detalhes procedimentais do novo sistema, tipo voto distrital, lista fechada, reeleição, calendário eleitoral etc. Poder-se-ia ter uma exceção, uma quarta pergunta, relativa ao financiamento público exclusivo. Por três motivos: porque a população deve se manifestar claramente sobre um ponto que interfere de fato na dinâmica eleitoral, porque esse ponto tem impacto no conjunto do orçamento público e porque a forma de financiamento está associada a algumas causas da corrupção. Fora isso, não se deveria fazer perguntas técnicas. Pelo menos não de imediato, a toque de caixa. Que sentido teria perguntar, por exemplo: você é contra ou a favor do voto distrital misto? O que a democracia ganharia com isso? A perguntas como essa, ninguém pode responder “sim” ou “não”. Cientistas sociais, ativistas, políticos, jornalistas, cidadãos tucanos e petistas, cada um tem um palpite, um chute, ninguém ainda parou para analisar as coisas. Induzir o povo a votar naquilo que alguém acha que pode funcionar não é fazer plebiscito. Estamos meio às escuras nesse terreno. Mais importante que um plebiscito é ter uma ideia para discutir com a sociedade e para a sociedade discutir. Forma e conteúdo precisam caminhar juntos. A alternativa não é não consultar a população, mas sim consultá-la de forma razoável. Se o PT tem uma proposta de reforma política, por que é que não a apresentou até agora? 82 As ruas e a democracia