As ruas e a democracia. Ensaios sobre o Brasil contemporâneo | Page 66

apesar de estar preso e condenado pela Justiça a 13 anos de cadeia por corrupção ativa e peculato. Foi uma demonstração clara de que já não se ouviam as vozes das ruas. Os que protegeram o prisioneiro com o voto ou a omissão empurraram a imagem do Legislativo um pouco mais para o fundo do poço. A atitude quase suicida da Câmara, porém, por vias transversas, chamou para si a crítica social, aliviando a contestação popular da ação governamental. O governo, ao mesmo tempo, mergulhou em uma maré positiva. Foi beneficiado, por um lado, pela desastrada oposição feita ao Programa Mais Médicos, que só aumentou sua receptividade na população e na opinião pública. Por outro, pela divulgação de que o PIB cresceu 1,5% no segundo trimestre do ano. O índice, que supera a taxa de países desenvolvidos e emergentes, inclusive os Estados Unidos, desmentiu as profecias negativas, transferindo mais oxigênio para Dilma. Num episódio confuso e mal esclarecido, diplomatas brasileiros promoveram a fuga do senador boliviano Roger Pinto, asilado há 450 dias na embaixada brasileira em La Paz. A fuga acarretou a demissão do ministro Antonio Patriota e muitas promessas de punição para os diplomatas envolvidos. E mostrou existir algum desacerto na política externa do país, que até então parecia acima do bem e do mal, assim como no relacionamento do Itamaraty com o Palácio do Planalto. A dificuldade de Marina Silva para legalizar sua Rede Sustentabilidade chamou atenção por ser paradoxal. Favorecida, mais que qualquer outro, pelo novo ritmo do país e pelas dificuldades dos demais postulantes à Presidência, Marina perderá muito caso seu partido não saia do papel. Terá de desistir da candidatura ou buscar asilo em alguma outra legenda, o que enfraquecerá dramaticamente sua imagem de política que flutua sobre os partidos e busca encarnar uma alternativa ao que considera ser a dimensão problemática do atual formato partidário. Se se filiar a um partido “normal”, terá de explicar muita 64 As ruas e a democracia