As ruas e a democracia. Ensaios sobre o Brasil contemporâneo | Page 46
res de consciência e de hábitos cívicos. Sem serem seduzidos
pelo governo representativo, ignorados pelo sistema político e
vivendo em um ambiente cultural fortemente influenciado por
lógicas de mercado e no qual o emprego tornou-se fator de incerteza, os jovens evoluíram rapidamente ou para o “consumismo” e a “despolitização” ou para novas formas de militância e
politicidade, invariavelmente refratários a partidos e sindicatos.
Passaram a se movimentar estimulados por redes sociais, que os
projetaram para as ruas em junho.
O quadro fica mais complicado quando se lembra o agravamento da violência urbana, que atinge de maneira perversa os
mais jovens. Não há boas e consolidadas políticas governamentais para a juventude, a não ser de modo episódico e localizado.
O jovem emerge no espaço público como vítima da violência e
da repressão policial, como consumidor e objeto de campanhas
publicitárias, não como sujeito. A taxa média de homicídios
atinge 28 por 100 mil habitantes, ao passo que os homicídios
juvenis alcançam 54 por 100 mil jovens. Os jovens também são
as principais vítimas de acidentes de trânsito, respondendo por
26,5% das vítimas fatais e 37% das vítimas não fatais. Do total
de mortes juvenis, 17% ocorrem em acidentes de trânsito.
Os índices alarmantes de mortalidade juvenil por causas
violentas, cruzados com o lugar privilegiado que têm as mortes
por acidentes de trânsito, ajudam a que se compreenda porque
uma manifestação de jovens contra o preço dos bilhetes de ônibus se alastrou com rapidez e virulência.
As grandes cidades brasileiras também são vítimas das opções governamentais feitas na última década e meia. Subsídios
recorrentes às indústrias automobilísticas e a facilidade ao crédito fizeram com que a frota urbana de veículos crescesse de
modo expressivo. Houve poucos investimentos em transporte
público. As periferias aumentaram em termos populacionais, e
os deslocamentos se multiplicaram. A população passou a per-
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