As ruas e a democracia. Ensaios sobre o Brasil contemporâneo | Page 216
ou for condenado por decisão de órgão colegiado, e ao proibir
que políticos condenados em decisões colegiadas de segunda
instância possam se candidatar, a Lei inaugurou nova etapa da
democratização brasileira. Mas até hoje ainda não conseguiu se
desvencilhar da polêmica e tem sua tradução prática obstaculizada, travada por interpretações contraditórias, pela impunidade e pela crença social de que os corruptos jamais serão devidamente criminalizados.
O conjunto de problemas que afloram no terreno imediatamente político – no terreno da representação política democrática
– faz com que o sistema representativo perca pontos preciosos e a
atividade parlamentar seja vista sempre pela ótica negativa.
Também não conhecemos a fundo o efeito que a falência dos
partidos como sujeitos de programa, vontade e ação tem na maré
montante da corrupção. Pela lógica, pode-se dizer que quanto
mais um partido abriga em seu interior pessoas que não partilham os mesmos ideais, que não têm uma filosofia de vida parecida, que usam a sigla somente como recurso para chegar ao poder ou que permitem que suas cúpulas fiquem obcecadas pela
manutenção dos espaços de poder, mais esse partido funcionará
como uma correia de transmissão entre o submundo e a política.
Todos os partidos brasileiros ficaram assim, uns mais, outros menos, o que complica dramaticamente a situação. Deixaram de ser
“escolas de quadros”, espaços privilegiados de seleção de lideranças ou organizadores de consensos sociais. São agências de agregação de interesses e de gestão de recursos políticos. Passaram a
potencializar os defeitos do sistema partidário, sua permissividade exagerada, sua flexibilidade e sua falta de critério institucional.
Colaboram, com ou sem intenção, para agravar a imagem negativa que a opinião pública tem da política.
Esses dois fatores combinam-se tragicamente no “presidencialismo de coalizão” típico do Brasil, minando ou dificultando
o que se tem em termos de avanço institucional no plano dos
214
As ruas e a democracia