As ruas e a democracia. Ensaios sobre o Brasil contemporâneo | Page 202
ções possam ser despejadas de cima para baixo sobre as pessoas.
As redes sociais movidas a internet produzem e distribuem informação à margem dos canais de comunicação criados e consumidos pelo establishment. Crescem rapidamente em importância e alcance, forçando as outras redes, mais antigas, à
mudança e à adaptação, o que nem sempre ocorre com facilidade (MALIN, 2013b). Parte dos problemas vivenciados hoje pela
mídia histórica tem a ver precisamente com isso.
Além disso, está em curso uma mudança cultural importante: em rede, as pessoas constroem a informação de modo cooperativo e dialógico; âncoras, oráculos e vozes reconhecidas perdem força; as fontes multiplicam-se; tudo é posto em questão,
repercutido instantaneamente e reformulado na sequência, se
for o caso, o que torna as linguagens, as narrativas e os conteúdos muito mais plurais e fora de controle. Não há donos ou proprietários no processo.
Vale pouco, nessa discussão, a constatação de que a grande
maioria da população permanece longe da internet e fora das
redes. Primeiro, porque o número desses outsiders decresce aceleradamente. E, segundo, porque o poder de reverberação das
redes é enorme e modela condutas e opiniões mesmo de quem
está fora delas.
Há, por outro lado, um problema que não parece em vias de
ser resolvido: o da qualidade da informação. Redes cooperativas
não têm em seu DNA a solução para isso, até porque o conceito
de “qualidade” está, também ele, submetido ao pluralismo e à
flutuação das opiniões. É por essa trilha que a mídia tradicional
continua a caminhar e a se legitimar.
Múltiplas questões enfileiram-se aqui. Elas complicam a
agenda da imprensa e do jornalismo em particular, seja em
termos éticos, seja em termos técnicos (como fazer uma cobertura, uma reportagem, como editar e escrever, como organizar
uma redação).
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