As ruas e a democracia. Ensaios sobre o Brasil contemporâneo | Page 187
redes e as agências de publicidade –, pode a sociedade deixar a
critério estrito do mercado questões como as que se referem à distribuição de verbas públicas e ao formato das campanhas publicitárias oficiais? Devem ou não os governos e os poderes de Estado
agir para evitar abusos e irregularidades nessa área, para regular a
competição, limitar a concentração da propriedade e garantir o
acesso aos veículos de comunicação? E como fazer isso sem ferir
a liberdade de imprensa e de criação e sem fazer do Estado (dos
governos) o único árbitro do problema?
Qualquer posicionamento em relação a essas questões, se se
pretender criterioso, precisa considerar o modo de vida atual e
realizar um esforço de compreensão dos processos sociais em
que estamos mergulhados. Sem isso, a discussão sobre a mídia
– sobre seu poder, suas funções e seu significado para a democracia – corre o risco de cair no vazio.
Hipermodernidade e formação de opinião
Em que sociedades vivemos? A variedade de termos com
que se tem buscado identificar a sociedade atual – sociedade
em rede, sociedade da informação, sociedade do espetáculo, sociedade de consumo, sociedade de risco – indica que nos encontramos em um momento de transição, no qual as estruturas
sociais, as instituições e as convicções parecem flutuar, sem
conseguir fincar raízes e se estabilizar. Um padrão ainda não
conseguiu se impor. Vivemos em busca de alguma forma nova
de vida coletiva, mas o antigo modo de viver não tem mais
como retornar, a não ser topicamente, reciclado e ressignificado. Ele completou sua desintegração e já não pode mais balizar
as condutas sociais ou fornecer parâmetros para os indivíduos,
que se “soltam” da vida social e agem com maior independência, obrigados a refletir cotidianamente sobre suas opções e decisões. Paradoxalmente, esses indivíduos tornam-se ao mesmo
tempo muito sensíveis e muito críticos aos apelos midiáticos, já
V. Mídia, democracia e hipermodernidade
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