As ruas e a democracia. Ensaios sobre o Brasil contemporâneo | Page 175

to é a política institucionalizada – os sistemas, as regras, a organização da democracia, as leis, os partidos – e mais ainda aquilo que podemos chamar de “política dos políticos”, qual seja, praticada pelos políticos, à moda deles, focada na conquista e no manejo do poder. A política como atividade dos cidadãos – como luta por direitos, como interesse cívico, vontade de participar e interferir na tomada de decisões, como preocupação com a vida comum e a boa sociedade –, essa não padece do mesmo mal, nem se ressente de falta de prestígio, embora esteja despojada de potência e efetividade. É a política dura que incomoda. Incomoda antes de tudo por um conflito ético que remonta às cavernas e está hoje exacerbado. A ética comum não consegue entender nem assimilar a ética política, particularmente em sua dimensão moral. Não aceita que os políticos simulem e dissimulem, que mintam, finjam e defendam interesses obscuros, que abusem da pressão e da demagogia, que busquem o poder a qualquer custo, muitas vezes passando por cima das boas maneiras, da inteligência e do interesse público. Hoje, como estão em boa medida “soltos” da sociedade, os políticos fecham-se em si e tornam-se expoentes de uma ética nonsense: por que fazem o que fazem se servem para tão pouco? O cidadão comum fica sem respostas. Há, depois, um defeito de ordem estrutural. Na sociedade em que estamos passando a viver – movida a velocidade, a informações, a imagens, a reviravoltas surpreendentes, a fluxos pouco controláveis – as instituições flutuam, sofrem para balizar as condutas individuais, os &V