As ruas e a democracia. Ensaios sobre o Brasil contemporâneo | Page 174
Atos de corrupção, abusos de autoridade ou defeitos da Justiça não podem ser vistos somente como um problema de servidores, juízes ou políticos. Não estão associados a uma degradação
da moralidade – daquilo que se refere ao homem moral, que
responde por seus atos tendo em vista a própria consciência individual –, mas sim a um padrão de eticidade, referida ao homem
ético, que define seus atos tendo em vista os outros homens. Têm
muito mais que ver com vida intersubjetiva e organização social
do que com caráter pessoal ou força institucional.
O pacto tentado em 2009 não reverberou, nem teve maiores
desdobramentos. Carregado de boas intenções, serviu basicamente como termômetro do estado da República e da “indiferença”
dos cidadãos. Num contexto assim determinado, estranho seria se
a classe política e as instituições representativas funcionassem
bem, agradassem à maioria, produzissem resultados e conseguissem erguer diques que as blindassem contra a corrupção.
Sem repercutir nesse terreno e envolver os atores sociais de
modo amplo, qualquer pacto republicano que vier a ser proposto será limitado e terá poucos efeitos virtuosos. Passa-se o mesmo com a reforma política, que se espera seja capaz precisamente de revigorar o republicanismo e as condições de
possibilidade de uma República democrática.
Mais política dos cidadãos
No mundo do capitalismo globalizado e da modernidade radicalizada, a política parece destinada a girar em falso, a mostrar pouca eficácia e a produzir mais problemas que soluções,
fato suficiente para que seja vista, pelos cidadãos, como um
ônus, um mal necessário. Ela está gravemente posta em xeque
pela vida e pelas disposições éticas hoje prevalecentes.
Há vários aspectos a serem considerados nessa discussão. Primeiro: não é a política como um todo que está vazia, sem consensos e com pouca legitimidade. O que está em estado de sofrimen172
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