As ruas e a democracia. Ensaios sobre o Brasil contemporâneo | Page 169
extremada, em benefício da realpolitik, da conquista de eleitores
e da conservação do poder – coisas que se diluíram em uma
sempre mais glorificada “ética da responsabilidade”.
O PT foi, na época pretérita que ficou para trás, o partido
que mais longe levou a ética extremada da convicção. Revestiu-a de ideologia, de promessas reformadoras, de compromissos
com a população pobre e abandonada. Fez disso uma plataforma que o projetou para o primeiríssimo plano da política nacional e o converteu no principal partido do país.
Vieram, porém, os governos Lula (2002-2010) e tudo se
transformou. O pragmatismo cortou o partido de cima a baixo,
ao mesmo tempo em que o personalismo de Lula o cortou da
esquerda à direita. O foco passou a ser muito mais o Estado do
que a sociedade civil ou a opinião pública, e o partido se entregou ao controle de posições políticas fortes, convencido de que
assim a mudança social aconteceria. Perdeu alguns anéis nessa
operação, assistiu à debandada de parte de seus setores mais à
esquerda e aceitou o protagonismo inconteste de sua liderança
máxima, que se tornou o condutor único de todas as operações,
da nomeação de ministros à escolha de candidatos às eleições.
Houve, entretanto, uma pedra no caminho. Lula e o PT não
conseguiram entrar em São Paulo, que se manteve – estado e
capital – sob controle do PSDB. O desafio paulista cresceu com
a vitória de Dilma Rousseff. Afinal, como projetar a preponderância petista em Brasília sem a conquista do principal estado
do país, epicentro da vida econômica e social?
O pragmatismo foi então radicalizado. Para as eleições municipais de 2012, decidiu-se fixar uma candidatura que tivesse
cheiro de tinta fresca, com a qual se pudesse contestar o predomínio tucano. E optou-se, mais uma vez, por dar uma guinada
para o centro, de modo a neutralizar a força que o PSDB acumulou nesse segmento crucial. Foi uma opção bem sucedida e
Fernando Haddad conquistou a prefeitura da maior cidade do
IV. Crise e reforma política
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