As ruas e a democracia. Ensaios sobre o Brasil contemporâneo | Page 166

O círculo se fecha depois das urnas. O sistema não cuida da qualificação dos eleitos. Não agrega nada à bagagem técnica e política com que chegam à Câmara. As sessões plenárias são o que são, não há o que esperar delas. Algo poderia acontecer fora delas. No entanto, são raras as tentativas de melhorar a formação e a atualização dos quadros parlamentares, tanto dos políticos quanto dos assessores. Cursos, seminários, debates, conferências, muita coisa poderia ser feita para dar maior consistência às bancadas e aos parlamentares. Realismo e pragmatismo Se a situação é assim tão ruim, por que a classe política – os governantes, os responsáveis políticos, os assessores, os dirigentes partidários – não reage, ou somente o faz de modo protocolar, como ocorreu depois da revolta de junho? A resposta fácil valoriza o que se costuma chamar de realismo político. Respeito à realidade dura da vida, em nome da qual nada é feito porque não se deseja instabilizar alianças e coalizões, nem oferecer terreno aos adversários. É uma resposta filosoficamente equivocada e politicamente suicida, que prolonga o sofrimento institucional e injeta turbulência na vida política. Não pacifica, não melhora a situação, não soluciona nenhum dos problemas políticos do país. Não ajuda ao governo, nem melhora a sorte das oposições. Por isso, não é realismo, mas pragmatismo, e mal compreendido. O realismo é precioso em política. Nesse universo, nem tudo o que brilha é ouro e nem sempre as coisas certas são feitas pelas melhores pessoas ou o mal deriva do mal. Max Weber falou isso no famoso ensaio sobre a política como vocação. Maquiavel, mais ainda, quando escreveu, no capítulo XV de O Príncipe, que é “mais conveniente procurar a verdade efetiva da coisa do que uma imaginação sobre ela”. E todo mundo sabe que nos ambientes políticos as evidências não correspondem necessaria164 As ruas e a democracia