As ruas e a democracia. Ensaios sobre o Brasil contemporâneo | Page 163

Marketing mal calibrado Os programas eleitorais são horrorosos: midiáticos, não políticos e nada educativos. Têm maior qualidade na parte dedicada aos cargos executivos, mas são simplesmente patéticos quando se trata dos candidatos às Assembleias Legislativas estaduais e ao Congresso Nacional. Tratam-nos como secundários, aprisionando-os em camisas-de-força que facilitam as coisas para os mais inexpressivos e tolhem os talentosos. Não abrem espaços para debates que valorizem o trabalho legislativo e expliquem sua importância para a população. Não fomentam a discussão substantiva, nem dizem ao eleitor qual a relevância e a posição que tal ou qual candidato tem no partido a que está vinculado. Aposta-se tudo, ou quase tudo, no horário gratuito, que funcionaria como um divisor de águas, o patíbulo de alguns e o altar da redenção de outros. Será mesmo decisiva a propaganda gratuita? Se sim, sob quais condições? Se não, por que motivos? O suposto tem sido sempre que, dado o alcance do meio (o rádio e a TV), quem tiver mais tempo disponível e souber tirar vantagem da exposição tenderá a crescer e a maximizar seus apoios, a ponto de promover reviravoltas surpreendentes ou consolidar posições em definitivo. Em nome dessa suposição, verdadeiras batalhas pela conquista de alguns segundos a mais de propaganda são travadas pelos partidos. E rios de dinheiro e de energia são canalizados para o horário gratuito, sob a gerência de homens de marketing. Maldição maior do sistema é que a mensagem termina sendo de péssima qualidade, com a consequência de que “os silêncios podem ser tão ou mais eloquentes do que o que é dito, porque as ladainhas rotineiras do horário político produzidas pelos marqueteiros não têm como suprir a ausência de programas políticos” (VIANNA, 2011, p. 107). Vista como medida de alto impacto democrático por facilitar a comunicação dos políticos com os cidadãos e abrir espaços IV. Crise e reforma política 161