As ruas e a democracia. Ensaios sobre o Brasil contemporâneo | Page 161
A situação de mal-estar não se deve aos movimentos sociais
e nem às oposições, que desapareceram do cenário, engolidas
por seus próprios dilemas. Eclode, evolui e se mantém porque a
política chegou a um nível tão baixo, tão ruim, que passou a liberar somente gases tóxicos e venenos. O ar ruim e as toxinas
contaminam antes de tudo o próprio sistema político e seus integrantes, empurrando-os escada abaixo.
O sistema fechou-se em si, como numa redoma. Alimenta-se de seus próprios produtos e respira um ar que circula represado, sem contato com o exterior. Funciona como se não existisse vida fora dele. Os interesses políticos tornaram-se interesses
dos políticos, de suas agendas e organizações.
O mal-estar é impulsionado pelo sistema partidário, com
seus humores sazonais, seus apetites desmesurados e sua baixa
qualidade. Os partidos precisam mostrar serviço para seus eleitores, engrossar e elevar a voz, provar que estão vivos. Não
abrem mão dos recursos de poder que controlam, pois não sabem fazer política sem eles. Procuram demonstrar força e aparecer como indispensáveis. Como se movem segundo uma racionalidade de avestruz, trombam o tempo todo. Quando
ameaçados de perder certos privilégios, debandam e saem em
busca de um novo porto onde possam atracar e recomeçar.
Os políticos, por sua vez, não enfrentam a crise. Parecem
despreocupados com seus desdobramentos, surdos às expectativ 2F