As ruas e a democracia. Ensaios sobre o Brasil contemporâneo | Page 159
sair da política para que se possa voltar a ter política. Ir onde o
povo está. Usar a imaginação. Mudar o modo de fazer, pensar e
organizar a política. Amplificar o que anda rolando nas redes,
nas ruas e na sociedade civil, por exemplo.
Por isso, a reforma política se converteu em passagem obrigatória para a transformação do país. É o novo nome da reforma do
Estado. Mas isso, que se anuncia como saída capaz de magnetizar a sociedade, requer esforços concentrados, largueza de visão e
criatividade. Que reforma poderá ser empreendida, a partir de
qual desenho, de qual proposta consensual mínima? Estamos
meio às cegas nessa área, por mais que o debate seja intenso. Há
muitas ideias, mas quando se trata de chegar a uma agenda, tudo
acaba por se resumir a fidelidade partidária e financiamento público, e mesmo assim com reservas. E quem a fará? Os reformadores formais – ou seja, os políticos –, legislando como têm feito
em causa própria, estão desqualificados para reformar as instituições. Também eles precisam ser reformados.
O fracasso da iniciativa da presidente Dilma Rousseff de propor um plebiscito para reformar a política teve a ver com isso, mas
também refletiu o despreparo e a desarticulação do centro político
do país. Muitos erros de condução e de comunicação foram cometidos. A tentativa de fazer a reforma por consulta popular sem
que se tivesse um projeto reformador que indicasse o que deveria
mudar, e como, mais atrapalhou que ajudou.
Não se deu devida atenção, naquela proposta, ao fato de que
o detalhamento de uma reforma política concentrada na dimensão eleitoral – eixo do que se pretendia – é um segredo de polichinelo, aquilo que faz com que uma reforma avance ou não.
As sugestões que circularam como justificativa da proposição
presidencial eram todas, sem exceção, controvertidas tanto no
mérito quanto na produção de efeitos. Financiamento público
de campanhas, por exemplo, pode significar que os partidos se
tornarão mais dependentes do Estado e não necessariamente
IV. Crise e reforma política
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