As ruas e a democracia. Ensaios sobre o Brasil contemporâneo | Page 153

C hega a intrigar que durante as últimas disputas eleitorais para a renovação da cúpula do sistema representativo brasileiro (em 2006 e 2010), assim como nos sucessivos pleitos municipais, nenhum candidato ou partido tenha falado em reforma política. A reforma ocupa o cenário nacional desde a Constituinte de 1988. Ora com estardalhaço, ora discretamente, tem sido vista tanto como exigência da democracia, quanto como panaceia para resolver o mal que a política causaria aos cidadãos, como recurso para moralizar a atividade dos políticos e colocar a política no devido lugar. Seria de se esperar que surgisse com pompa e ênfase na propaganda dos candidatos e nos debates que travam entre si. Não é o que acontece. De política mesmo, os candidatos falam pouco, e quase sempre sem usar a palavra. Seus discursos concentram-se em realizações, passadas e futuras. Dedicam-se à conquista do governo, apresentado como instrumento para mudar o mundo. É certamente um modo de falar de política, mas não o único nem o melhor modo, pois deixa de fora o que realmente importa: as relações entre o poder e os cidadãos, seja no sentido de controlar os excessos e a força do poder, seja no sentido de civilizar as lutas 151