As ruas e a democracia. Ensaios sobre o Brasil contemporâneo | Page 148

das e políticas. Irá, também, produzir impactos na área dominada pelo PT, a começar das próprias estruturas partidárias. Nada disso significa que as oposições irão se beneficiar, até porque elas também passaram a ser questionadas pelas ruas e têm seus próprios problemas internos, de voz e de imagem pública. Além disso, não parece haver muita vida inteligente e determinação nos partidos e nichos oposicionistas. Eles estão presentes no cenário, ocupam posições de força em âmbito regional, atuam no Congresso, mas não conseguem evoluir. Amoldaram-se ao sistema, jogam o jogo de modo reativo, conforme as iniciativas governamentais. O destino político do governo Dilma não está selado e será definido conforme os próximos passos governamentais. Paradoxalmente, Dilma encontra nesta situação os principais elementos que poderão dificultar sua atuação. É que ela obtém condições de governabilidade em um sistema que praticamente impede uma articulação expressiva entre Estado e sociedade, roubando-lhe precisamente os elementos que poderiam ensejar uma governabilidade democrática sustentável. Seu governo governa de modo até certo ponto inercial: menos por sua própria dinâmica e mais pela falta de movimento autônomo da sociedade, que não se contrapõe a ele. Também recebe ajuda indireta das oposições, que não conseguem agir como projeto alternativo. Parte desta situação aparece nas tensões que têm atravessado o governo desde os seus primeiros dias. São tensões internas ao sistema, que nascem nas bases parlamentares e políticas do governo. A maioria que lhe dá condições de operacionalidade política não se mostra confiável e lhe transfere permanentes demandas fisiológicas (por cargos, verbas, controle de recursos políticos), muitas vezes paralisando-o ou dificultando sua ação. O sistema também permitiu que vários mecanismos de corrupção se infiltrassem nas altas esferas governamentais, criando desgaste e conflitos complicados. 146 As ruas e a democracia