As ruas e a democracia. Ensaios sobre o Brasil contemporâneo | Page 104

crise. Tal como a presidente, os democratas acreditam na inteligência dos brasileiros. Por isso, não aceitam que o povo seja convocado para decidir o que quer que seja sem que possa discutir. Se a intenção é fazer uma consulta popular que forneça o espirito de uma reforma democrática, o debate público é essencial. Não ocorrendo, a decisão será por palmas ou vaias, ao sabor da força sedutora de lideranças e campanhas publicitárias. Por ter inteligência, o povo quer espaços de reflexão, diálogo e debate democrático. Uma reforma política feita com debate público e participação popular é a joia da coroa. Não se deveria estragá-la. A articulação política dos democratas seria decisiva, também, para que se enfrentasse o problema das minorias. As maiorias avançam, fazem sentir sua voz e se democratizam. Mas o que fazer com as minorias, como assimilá-las, respeitá-las, atendê-las, e enfrentá-las se necessário for? As minorias são, por princípio, merecedoras de toda justiça social. Algumas lutam por identidade e reconhecimento. Outras querem mais espaço e mais oxigênio. São como o sal da terra: estão aí para que as maiorias lembrem que desigualdades, injustiças e diferenças existem e precisam ser enfrentadas. Mas o que fazer com as minorias do mal? Com aqueles, por exemplo, que deformam a política do confronto de ideias para, em nome da intransigência, estigmatizar os que pensam diferentemente deles, jogar grupos contra grupos, taxando uns de “elitistas” e outros de “amigos do povo”? Essas minorias vivem da estigmatização alheia e não é por acaso que seu vocabulário, seu discurso, sua narrativa, são invariavelmente hiperbólicos, adjetivados, raivosos e ressentidos. Não falam “discordo de você”; preferem dizer: “não aceito essa tua deslavada e sórdida mentira, seu reacionário vulgar”. Acham que isso é fazer crítica. Uma categoria pior é a dos que se agrupam para pressionar e humilhar as maiorias, ou pessoas que integram as maiorias. 102 As ruas e a democracia