A democracia sob ataque | Page 28

reduzido arbitrariamente . Palavras do economista especializado em contas públicas Raul Velloso : “ Na realidade , é uma proteção para não haver corte nas áreas , mas está sendo interpretado como o contrário . Nenhum outro item poderá crescer à custa de educação e saúde . Quem trabalha nas duas áreas estará protegido , porque são pagos pelos orçamentos de ministérios protegidos . É só não contratar tanto e dar reajuste pela inflação ”.
A PEC é omissa na questão de saber como se gasta , onde se gasta , quanto há de desperdício e ineficiência , qual o impacto real da corrupção e o que fazer para contê-la . Sem abrir esta caixa preta , todo esforço poderá ser inútil ou produzir pouca coisa . Se se fixar um teto para os gastos sem avaliar a qualidade global dos gastos , o conjunto não ficará de pé . Supondo que alguma perda orçamentária haverá , como calibrar a qualidade dos serviços – a gestão – para que não haja prejuízo para a população ? Nem tudo se resolve com mais verbas .
O que será feito , por exemplo , com o custo da Previdência , terreno delicadíssimo e potencialmente impopular , que ficou inteiramente fora da PEC ? Conforme for seu desenho , maior ou menor será seu impacto na gestão orçamentária global , até mesmo porque o custo da Previdência é corrigido por critérios próprios . Junto com a assistência social , a Previdência consome cerca de 50 % dos gastos federais , o que significa que o governo administra somente metade do orçamento , que é precisamente aquilo que obedecerá ao teto . E aí a disputa por recursos será encarniçada .
O que ocorrerá com as isenções fiscais , que consomem uma massa absurda de recursos de utilidade social bastante discutível ? Tais desonerações beneficiam empresas , que em princípio dão retorno com a criação de empregos , mas também premiam igrejas , e isso num país em que o Estado é laico . É preciso por tudo isso na mesa , juntamente com o crédito subsidiado , o crédito facilitado , certos mecanismos protecionistas , as licitações e compras do setor público .
A estrutura brasileira de tributação é perversa e injusta . Tem vetores de progressividade , mas no fundamental cai muito mais sobre o consumo e a renda do trabalho do que sobre a renda do capital . Diz-se que é assim para que se possa fazer a economia crescer e favorecer a arrecadação , explicação meio cínica . O problema está exposto há décadas .
E os governos – tanto os de Lula e Dilma , quanto o de Temer – ficam paralisados diante da situação , porque simplesmente não
26 Marco Aurélio Nogueira