A democracia sob ataque | Page 161

imparcialidade e incorporação de uma visão pluralista que brota da sociedade . Supõe também a recusa à famigerada barganha político-eleitoral que muitos governos – até os que se declaram de esquerda – acabaram por reproduzir , mesmo que embalada em maquiagens modernas , contribuindo com a reprodução de uma visão oligarquizada e patrimonialista do Estado , nefasta à democracia . Uma política cultural democrática deve ser aberta e projetada para servir à cultura e só a ela . Deve fazer jus à ideia de que a cultura é uma esfera social e humana que supre e , ao mesmo tempo , gera novas necessidades culturais .
Integrados ao mundo como sempre fomos , nós , brasileiros , invariavelmente nos inclinamos a promover uma perspectiva cultural de superação das fronteiras artificiais e reducionistas que opõem o caráter popular ao erudito , essa “ muralha chinesa ” mental que vem criando obstáculos à intersecção dessas duas dimensões culturais da nossa formação histórica . Algo que nunca fez muito sentido porque nossa cultura sempre expressou hibridismo e uma mescla étnica que impediram o estabelecimento de guetos culturais e populacionais , como em outras histórias nacionais .
Uma política cultural progressista se pauta , portanto , na máxima qualificação da produção cultural , seja ela de perfil popular ou não . O País precisa resgatar e dar um novo curso a essa visão . Trata-se de uma tarefa que depende – mas a supera – da esfera dos artistas e intelectuais e deve ser assumida por toda a sociedade .
O embate desastroso provocado na sessão do Prêmio Camões só contribuiu para impedir que se discuta com abertura , pertinência e profundidade o que deve ser discutido na área cultural . Foi , mais uma vez , a imposição de uma narrativa estapafúrdia que só faz consumir nossas melhores energias .
Cultura , modernidade e democracia
159