A crise não parece ter fim PD48 | Page 79

se realizar e ser responsável por si mesmo, de se superar cada vez mais na aventura empresarial” (p. 366). Para o sujeito neoliberal, não há quadro estável, carreira previsível e solidez nas relações humanas. A vida profissional é feita de “transações pontuais” (e não de relações sociais), com o mínimo de lealdade e fidelidade. E, como empresa de si mesmo, EU S/A vive, diuturnamente, em risco. Como ressaltam os autores, “O risco tornou-se um setor comercial, na medida em que se trata de produzir indivíduos que poderão contar cada vez menos com formas de ajuda mútua de seus meios de pertencimento e com os mecanismos públicos de solidariedade. Do mesmo modo e ao mesmo tempo em que se produz o sujeito de risco, produz-se o sujeito de assistência privada. A maneira como os governos reduzem a cobertura socia- lizada dos gastos com doenças e aposentadoria, transferindo a sua gestão para empresas de seguro privado, fundos comuns e associações mutualistas intimados a funcionar segundo uma lógica individualizada, permite estabelecer que se trata de uma verdadeira estratégia” (p. 348). A norma do risco muda, e ele passa a ser menos “risco social”, assumido pelas políticas públicas, e cada vez mais “risco ligado à existência” (p. 349). Para Dardot e Laval, a crise mundial é “a crise de um modo de governo das economias e das sociedades baseado na generaliza- ção do mercado e da concorrência” (p. 27), que corrói os laços sociais e destrói, conforme Ulrich Beck (Sociedade de risco: rumo a outra modernidade. 34, 2010), citado pelos autores, a dimensão coletiva da existência, liquidando tanto as estruturas tradicio- nais, sobretudo a família, quanto as classes sociais. Mais que nunca, é preciso superar o neoliberalismo, lutar por outra razão do mundo; porém, para tal, como advertem os auto- res, não se pode “Continuar a acreditar que o neoliberalismo não passa de uma ‘ideologia’, uma ‘crença’, um ‘estado de espírito’ que os fatos objetivos, devidamente observados, bastariam para dissolver, como o sol dissipa a névoa matinal, é travar o combate errado e condenar-se à impotência. O neoliberalismo é um sistema de normas que hoje estão profundamente inscritas nas práticas governamentais, nas políticas institucionais, nos estilos geren- ciais” (p. 30). Eu S/A, o sujeito neoliberal 77