A crise não parece ter fim PD48 | Page 77

Eu S/A, o sujeito neoliberal Cláudio Ferreira Lima P ierre Dardot, filósofo, e Christian Laval, sociólogo, publi- caram A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal (Boitempo, 2016), obra de esclarecimento político sobre o neoliberalismo, que colheu farta contribuição do seminá- rio “Question Marx”, organizado por eles para discutir o pensa- mento de Marx e do marxismo. Considerada pela crítica como engenhosa interpretação do capitalismo atual, tem, como refe- rência central, “Nascimento da biopolítica”, curso ministrado por Michel Foucault, no Collège de France, em 1978-1979, editado no Brasil pela Martins Fontes, em 2008. Trata-se, portanto, da abordagem do modo de governo, ou seja, do modo de conduzir a conduta dos homens, tanto a conduta que se tem para consigo mesmo quanto para com os outros. Assim, o neoliberalismo é, em essência, “uma racionalidade e, como tal, tende a estruturar e organizar não apenas a ação dos governantes, mas até a própria conduta dos governados” (p. 17). A norma de vida neoliberal “impõe a cada um de nós que viva- mos num universo de competição generalizada, intima os assala- riados e as populações a entrar em luta econômica uns com os outros, ordena as relações sociais segundo o modelo de mercado, obriga a justificar desigualdades cada vez mais profundas, muda até o indivíduo, que é instado a conceber a si mesmo e a compor- tar-se como uma empresa” (p. 16). Pois bem, a respeito desse indivíduo-empresa, que se constitui peça-chave na dominação neoliberal, os autores dedicaram o capítulo mais alentado do livro, que se intitula – et pour cause – de “A fábrica do sujeito neoliberal”. Como se dá então a produção desse sujeito empresarial? Dardot e Laval explicam: “Não estamos mais falando das antigas discipli- nas que se destinavam, pela coerção, a adestrar os corpos e a dobrar os espíritos para torná-los mais dóceis – metodologia insti- tucional que se encontrava em crise havia muito tempo. Trata-se agora de governar um ser cuja subjetividade deve estar inteira- mente envolvida na atividade que se exige que ele cumpra” (p. 327). 75