A crise não parece ter fim PD48 | Page 70

a construção de um movimento, dentro e fora dos partidos, para um trabalho de amplo esclarecimento e conscientização da popu- lação, abordando principalmente a superioridade e a utilidade prática do parlamentarismo em relação ao presidencialismo que tanto nos desgasta e atravanca. Na remoção dos obstáculos ideológicos que se antepõem recor- rentemente à mudança parlamentarista está o mito da “tradição” presidencialista do Brasil. Falar em tradições políticas num país de recente passado colonial, de passageira monarquia e de uma democracia ainda adolescente chega a ser abusivo do ponto de vista histórico. O outro mito insustentável é o fantasma da instabilidade na qual o Brasil seria mergulhado como resultado da adoção do parla- mentarismo. Basta comparar esse temor com a realidade gritante do momento presidencialista atual para se convencer do contrário. De fato, se formos falar de crise e instabilidade bastaria citar o quadro de desagregação e paralisia provocado pelo último governo Dilma e a agonia do governo Temer para verificar como o sistema presidencialista é incapaz de resolver suas crises de legitimidade sem colocar o país inteiro em sobressalto permanente e à mercê de tão desgastante e prolongada instabilidade político-institucional. Nas condições do parlamentarismo, a crise política brasileira já teria redundado na dissolução do parlamento e na convocação de eleições antecipadas com a formação de um novo ministério e a recomposição das forças políticas. Se a profundidade da crise assim viesse a exigir, o remédio, embora amargo, voltaria a se repetir, até obrigar essas forças políticas à produção de uma maioria estável capaz de colocar em prática um programa de governo mais definido, baseado em princípios e escolhas estraté- gicas melhor debatidas e compreendidas pelos eleitores. Ademais, como no parlamentarismo as funções de Estado e de governo são exercidas separadamente (a primeira delas pelo presi- dente da República e a segunda pelo primeiro ministro), numa situação de crise dificilmente os ocupantes das duas funções estariam ao mesmo tempo envolvidos em escândalos a ponto de ambos ficarem ameaçados de perda simultânea dos seus cargos. Normalmente, como o presidente da República, no parlamenta- rismo, tende a ser um político de maior experiência e trajetória conhecida e reconhecida, além de ocupar-se das políticas de Estado de longo curso e de estabilidade mais garantida, em momentos de queda do governo e do primeiro ministro, ao presi- 68 Anivaldo Miranda