A crise não parece ter fim PD48 | Page 22

casos – especialmente naqueles em que todas as partes são mais relevantes – o crime compensa ?
Pouco altera , para o que vai ser adiante analisado , o ultimatum do MPF à JBS fixando condições pecuniárias duras para que se celebre um acordo de leniência . Mesmo veraz , ela não remediará o estrago político causado pelo tratamento voluntarista e heterodoxo , para dizer o mínimo , que o comando da instituição deu à delação premiada dos seus proprietários . Assim como não anula o tratamento privilegiado e comparativamente injusto , em termos econômicos e de abstenção penal , concedido a tais delatores . Bois gordos foram postos à frente do carro da política , de modo a levá-lo a parar e ter sua rota a seguir desviada , rumo a um pasto ignorado .
À parte as controvérsias habituais sobre intenções e motivações , bem como sobre a validade ética e a eficácia prática de tais ou quais técnicas de investigação policial , o timming e a metodologia da operação levaram a ação da Procuradoria-Geral da República a assumir , objetivamente , o risco de provocar uma virtual queda de um governo de transição constitucional que naquele momento atuava , a duras penas , nos limites permitidos por circunstâncias herdadas e novas e nos da precária qualidade dos valores morais da elite política que acessou o poder dentro , também , dos marcos constitucionais . Tal governo , de manifesto caráter parlamentar , impôs-se as missões de restabelecer a governabilidade política em interlocução com o Congresso e de reverter a recessão econômica e o desemprego que se radicalizaram quando essa governabilidade faltou , a partir de 2015 . O cumprimento até então exitoso da primeira missão e os ainda tímidos e ambíguos sinais de encaminhamento da segunda foram suspensos , quem sabe revertidos , pelo uso inédito de um bisturi mais cortante , cujo manejo deve estar , constitucionalmente , condicionado ao escrutínio do Poder Judiciário .
Em vez de acolher a hipótese de inflexão também na conduta até aqui sóbria do ministro Fachin , prefiro pensar que o STF foi , mais uma vez , colocado diante do fato incontornável de que não poderia deliberar livremente sobre a homologação da delação relâmpago , dado o mais que provável e , afinal , consumado vazamento do conteúdo das informações para veiculação por medias ávidos por acessá-las para antecipadamente julgar , mais do que para informar . Mas ainda não se sabe ao certo se e como o STF deu consentimento prévio ao até então inédito script procedimental adotado pelo MPF para a obtenção de provas nesse caso . Mais intri-
20 Paulo Fábio Dantas Neto