A crise não parece ter fim PD48 | Page 206

Na realidade, este processo estava particularmente visível já depois da Primeira Guerra Mundial: o tempo de Gramsci está ligado ao nosso. Observo duas coisas: que a globalização começa muito antes do fim da guerra fria, uma vez que uma crescente interdependência já se inicia no final do século XIX, e também que não existia uma forma de hegemonia evidente. Com a lingua- gem de hoje, poderíamos dizer que não havia nos anos vinte e trinta uma governance mundial, e esta também é uma tendência de nosso século. Outra tendência de nosso século é a crise da esquerda pratica- mente por toda parte. Como explicá-la? É um tema que nos atinge e preocupa há tempos. Não é uma crise recente e devemos recuar uns passos, embora seja verdade que ninguém tem a receita. No entanto, existem muitas razões para tal crise: houve a ideia segundo a qual, depois do fim do comunismo, fosse possível fazer uma nova esquerda democrática, era a época da Terceira Via, dos Blairs e Clintons. Uma experiên- cia de esquerda reformista e antitotalitária que emperrou no final do século. Acredito que este foi o início do declínio. Ainda estamos um pouco presos ali e penso que a esquerda, hoje, ainda não ajus- tou as contas com o paradigma progressista segundo o qual o progresso é sempre linear e irrefreável. A esquerda é uma das vítimas da globalização e entrou em crise com o esgotamento do welfare state. E afinal, como se sabe, quando a política está em crise, com mais razão está a esquerda. A direita se ressente menos disso? A direita é mais capaz, desde sempre, de se valer dos senti- mentos das pessoas, do medo. A esquerda não tem este tipo de possibilidade e, portanto, na falta de Política, aquela com o famoso P maiúsculo, sofre mais. Um conselho seu. Estamos sempre naquele ponto: comecemos a rever o para- digma progressista. A esquerda deve viver e deve se contrapor à direita. Cometeremos um erro histórico se pensarmos que estes valores não mais existem. Tem razão. Basta ver as reações à lei contra a apologia do fascismo. Disseram que é liberticida. E foi a coisa mais gentil que disseram. 204 Silvio Pons