Na realidade, este processo estava particularmente visível já
depois da Primeira Guerra Mundial: o tempo de Gramsci está
ligado ao nosso. Observo duas coisas: que a globalização começa
muito antes do fim da guerra fria, uma vez que uma crescente
interdependência já se inicia no final do século XIX, e também
que não existia uma forma de hegemonia evidente. Com a lingua-
gem de hoje, poderíamos dizer que não havia nos anos vinte e
trinta uma governance mundial, e esta também é uma tendência
de nosso século.
Outra tendência de nosso século é a crise da esquerda pratica-
mente por toda parte. Como explicá-la?
É um tema que nos atinge e preocupa há tempos. Não é uma
crise recente e devemos recuar uns passos, embora seja verdade
que ninguém tem a receita. No entanto, existem muitas razões
para tal crise: houve a ideia segundo a qual, depois do fim do
comunismo, fosse possível fazer uma nova esquerda democrática,
era a época da Terceira Via, dos Blairs e Clintons. Uma experiên-
cia de esquerda reformista e antitotalitária que emperrou no final
do século. Acredito que este foi o início do declínio. Ainda estamos
um pouco presos ali e penso que a esquerda, hoje, ainda não ajus-
tou as contas com o paradigma progressista segundo o qual o
progresso é sempre linear e irrefreável. A esquerda é uma das
vítimas da globalização e entrou em crise com o esgotamento do
welfare state. E afinal, como se sabe, quando a política está em
crise, com mais razão está a esquerda.
A direita se ressente menos disso?
A direita é mais capaz, desde sempre, de se valer dos senti-
mentos das pessoas, do medo. A esquerda não tem este tipo de
possibilidade e, portanto, na falta de Política, aquela com o famoso
P maiúsculo, sofre mais.
Um conselho seu.
Estamos sempre naquele ponto: comecemos a rever o para-
digma progressista. A esquerda deve viver e deve se contrapor à
direita. Cometeremos um erro histórico se pensarmos que estes
valores não mais existem.
Tem razão. Basta ver as reações à lei contra a apologia do
fascismo. Disseram que é liberticida. E foi a coisa mais gentil que
disseram.
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Silvio Pons