A crise não parece ter fim PD48 | Page 188

“A América Latina nasceu com a modernidade e se vinculou à sua dinâmica histórica, suas crises e destino” (p. 23). Esta situa- ção transformou a Europa do século XIX num referencial para a América Latina, assim como engendrou uma persistente atitude antieuropeia. Foi após a segunda guerra mundial que o modelo norte-americano passou a exercer influência e mesmo um poder excessivo nas sociedades latino-americanas, suplantando defini- tivamente o europeu tanto na adesão quanto no rechaço. “O que o autor sinaliza é que há, hoje em dia, uma potencial reorientação que favorece o modelo oriental – dado o deslocamento do eixo econômico para o Pacífico – mas salienta que a capaci- dade, digamos, da China, em promover uma interação cultural é muito limitada (p. 23). Há um equivoco generalizado que ganhou força em algumas correntes de análise da segunda metade do século XX: o de se atribuir à influência das grandes nações imperialistas a inteira responsabilidade pelos problemas da América Latina. Isto tira da equação o poder decisório dos povos latinos, assim como descon- sidera as peculiaridades e o peso de suas dinâmicas internas. É justamente na contramão deste tipo de análise que Um lugar no mundo segue sua trilha investigativa, tentando ler os fenômenos únicos gestados pelos povos latinos como expressões de suas escolhas, de sua cultura política e da singularidade de seus siste- mas democráticos. A modernidade na América Latina foi cons- truída à sua própria maneira, mas não se pode negar que um dos maiores defeitos dessa construção é a fratura entre democracia política e democracia social (p. 26). É sobre uma dessas construções singulares da modernidade latino-americana que se debruça o primeiro capítulo do livro: o fenômeno a que se convencionou chamar populismo. Sua emer- gência nesta parte do continente é vista como um traço marcante de nossa expressão democrática, e suas peculiaridades estão ligadas às peculiaridades de um outro conceito que noutras partes (i.e. Europa, América do Norte e mesmo Ásia) teve uma conotação distinta: o de “massas”. Na América Latina o termo “massas” é vestido de uma acepção antes política que social: “‘Massas’, na América Latina, aparece, quase que generalizadamente, como a identificação discursiva de elementos sociais em estado de confrontação com a ordem política estabelecida” (p. 33). “Populismo” foi o nome que se deu à expressão política do movimento modernizador que integrou parcelas significativas das 186 Bruno Cesar Cursini