chegar a uma conclusão como essa. Seja como for, em uma época
em que a extrema-direita, os fascistas, e a esquerda anacrônica
se nivelam sob o manto comum do ultranacionalismo, do popu-
lismo e do autoritarismo convém refletir sobre isso.
• As classes dominantes temem a aliança dos intelectuais com
as classes subalternas por um motivo: elas mesmas fizeram essa
aliança, no quadro das diversas revoluções burguesas. Daí terem
pleno conhecimento de que o mundo material – aquele da produ-
ção e da circulação das mercadorias – não se mantém de pé sem
o mundo espiritual – aquele da elaboração e da aplicação das
ideias e das teorias.
• "Batuque é um privilégio / Ninguém aprende samba no colé-
gio". Estes versos de Noel Rosa revelam com a acuidade própria do
grande compositor carioca que as vias de acesso à criação e à
cultura não são necessariamente as mais tradicionais. Hoje em
dia, com o entrelaçamento cada vez maior entre educação, cultura
e comunicação, Noel Rosa teria ainda mais razão. Aí estão a inter-
net, os cursos livres, o movimento editorial, as exposições reve-
lando que há todo um conjunto de saberes que vai além do sistema
educativo tradicional. Se isso não é democratização do conheci-
mento, então não sei o que é. Na verdade, o aprendizado por conta
própria é uma realidade cada vez mais presente no mundo de
hoje. Os caminhos que levam ao conhecimento são mais plurais
do que normalmente imaginamos.
• Os nômades da Mauritânia se deslocavam pelo deserto carre-
gando no dorso dos dromedários cerca de três mil manuscritos,
os quais compunham uma formidável biblioteca itinerante. Qual
a lição que se pode extrair disso? Que o homem sabe muito bem
o quanto é necessário acumular e armazenar para poder depois
então transmitir.
• O que rege as sociedades sem classes, ditas primitivas,
segundo o antropólogo Claude Lévi-Strauss, são as estruturas de
parentesco e as divisões por idade e sexo. Pois bem, a pergunta é:
o fato de algumas dessas questões – e poderíamos citar aquelas
que envolvem os gêneros e mesmo os chamados conflitos entre as
gerações – se alinharem entre as nossas preocupações mais
prementes não estaria revelando também, à sua maneira, um
início de ultrapassagem das estruturas de classes em nossas
sociedades ditas evoluídas? Ou pelo menos a uma redução do
peso dos embates entre as classes no mundo contemporâneo, sob
a égide das mudanças que se operam na base material das socie-
Notas Culturais II
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