A crise não parece ter fim PD48 | Page 174

Esse “Seu Pedro Comello” era um imigrante italiano (Novara, 1874-Cataguases, 1954), “pintor talentoso, retratista por excelên- cia, dotado de grande habilidade artesanal”, como descreve Paulo Emílio Salles Gomes in Humberto Mauro, Cataguases, Cinearte. Mauro junta-se então a Comello e – com uma Pathé-Baby 9,5 mm, pequena câmera utilizada à época para registro dos chamados “ABCs” (Aniversários, Batizados, Casamentos) – já se inicia no cinema como autor. Ao invés de filmarem as famílias, eles partem logo para uma fita de ficção. Foi essa curiosidade que o levou a fazer cinema, criando com seu grande talento uma linguagem própria e sempre inovadora. Valadião, o Cratera, curta-metragem de 1925, foi um filme- piloto que atraiu o comerciante Homero Cortes para “esse negócio de fazer cinema”. Conquistado, Homero vai ao Rio com Mauro e voltam de lá com uma Ernemann 35 mm, câmera profissional. Logo, junta-se a eles outro comerciante, Agenor de Barros, e fundam uma produtora, a Phebo Sul America Film. Com Pedro Comello na câmera, o cineasta inicia ainda em 1925 seu primeiro longa-metragem, Na Primavera da Vida, que estreia em Cataguases em 1926. Como protagonistas, Francisco Mauro, irmão de Humberto (que atua com o nome de Bruno Mauro) e Eva Comello (a heroína do filme anterior, que adota o nome de Eva Nil). Mocinha dessas duas fitas, Eva fica mais conhecida pelas fotos estampadas em várias revistas da época, que a transformaram na “estrelinha de Cataguases” – perenizada pela câmera do pai, Pedro Comello. “Humberto? ele era dernier-cri” – disse um dia Maria Vilela de Almeida, moça de uma ‘beleza extremamente fina’, a dona Bêbe, que nunca se esqueceu da primeira vez que o viu, “passeando a cavalo, a camisa de lã grossa com bolsos pregueados”. Moço da moda, popular, querido, Humberto Mauro se destacava na cidade. O casamento dos dois realizou-se em 1920, e durou a vida inteira. Aos olhos sentimentais da cidade, Humberto e Bêbe apareciam como o Romeu e Julieta de Cataguases: era o casal mais belo da região da Mata. Em 1926, com a saída de Eva Nil, que resolve não mais filmar com a Phebo, Mauro tem que providenciar às pressas outra estrela. Com o nome artístico de Lola Lys, Bêbe é a mocinha de Thesouro Perdido, sua nova realização. Das centenas de filmes que iria realizar, este ficou como o seu predileto. Não só por contar com vários familiares como por ser a fita também uma prova do bom emprego de algumas técnicas absorvidas do contato no Rio com o cinéfilo Adhemar Gonzaga, 172 Ronaldo Werneck