A Capitolina 1, janeiro 2014 | Page 14

capitolina entrevista

Para você, o que é ser um editor?

Penso que, antes de tudo, é preciso entender o significado da palavra “editor”. Em português, confundem-se dois sentidos: o da pessoa que faz a edição propriamente dita, isto é, corrige, adapta, seleciona ilustrações etc.; e o sentido de “publicador”, que é o empreendedor ou instituição, oficial ou não, com fins lucrativos ou não, que faz a publicação, distribuição e venda de um livro.

Assim, um revisor de texto é um editor, e um diagramador é um editor. O executivo de uma editora é o “publisher”. É claro que uma pessoa pode desempenhar mais de um papel, inclusive o autor que é editor de si mesmo, algo muito em voga hoje em dia com a facilidade da autopublicação, proporcionada pela impressão digital e a facilidade de distribuição em meio eletrônico, os downloads de e-books na internet.

Eu sou o “publisher” da Editora Ocelote.

O que você procura

num escritor criativo?

Que seja visceral. Hoje não me importa tanto o rigor gramatical, e acho que importa mais ou menos o estilo. Mas procuro identificar se o autor ou autora escreveu com o fígado, com os rins. Se ele escreveu com a verdade, a verdade dele. Estamos cheios de exemplos de escritores que não foram reconhecidos em suas épocas, e hoje são considerados gênios da literatura. Seguir fórmulas preexistentes exige mais competência técnica, o escritor tem que provar que assimilou o método e agregou a ele algum valor. Já uma escrita de arrojo pode ousar mais, e com isso também corre o risco de não ser apreciada de imediato, pois faltará a quem a lê ter um parâmetro, um similar com o qual possa ser comparada.

E como leitor?

E que você procura num escritor criativo?

Que seja visceral! Amo histórias em quadrinhos, que sempre permitiram essa liberdade. E também curto demais os clássicos, todos que já li são surpreendentes e mostram porque se tornaram clássicos: ser clássico não é ser antigo, ser clássico é persistir no tempo, e parte disso vem dessa “coisa” visceral. “O Gato Preto” e “A Metamorfose”, pra citar dois exemplos, têm essa visceralidade. Um tempo atrás, passei a me interessar pela chamada “pulp fiction” norte-americana, existe uma editora brasileira fazendo um excelente trabalho de resgate, e fiquei deslumbrado com Philip K. Dick. É um escritor muito visceral, e é um dos meus favoritos.

É mais difícil encontrar escritores criativos ou espaço para eles?

Muitas pessoas são criativas, é difícil estabelecer rótulos e padrões para o que é ser “criativo”. Penso que tem muita gente parada, gente que imagina coisas fantásticas, mas não se mexe para concretizar o que pensou. O que falta muitas vezes não é a criatividade, é a iniciativa.

O espaço sempre se encontra, pode ser num shopping em bairro nobre, ou pode ser na feira-livre com os livros na prateleira de aramado desmontável. Alguém vai se interessar pelo que você tem, mas você precisa ter a coisa primeiro. Poucos se interessam em ouvir ideias, coisa abstrata; você precisa ter o produto na mão, para poder mostrar a coisa concreta, ainda que não seja em sua forma definitiva.

Lucio Gonçalves

Editor (ou seria publisher?) da Editora Ocelote,

foi responsável por diversos trabalhos, como "O Breve Verbo", de Antônio Eder e, mais recentemente, "Amaríssimo", de Clarice Paes, ele cedeu um pouco de seu tempo para a primeira "Capitolina entrevista" e o resultado está ai! Com muita sinceridade, ele fala do trabalho de editor, escritores criativos e esse mundo todo dos livros (e quadrinhos)!

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