1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 86

Hélio Jaguaribe também procura mostrar o caráter recessivo da ditadura. Pécaut frisa este traço do pensamento do isebiano nessa época, dizendo que Jaguaribe acentua as consequências da abertura incondicional da economia brasileira aos investimentos estrangeiros que levariam o país “para uma insuportável concentração de riqueza e para a estagnação” (expressão de Jaguaribe, citado de artigo de 1967). Para Jaguaribe, estas implicações “revelam ‘contradições’ que minam o modelo”. A primeira, diz ele, “decorre da impossibilidade classicamente formulada por Marx de manter, por muito tempo um processo de concentração econômica”. A segunda, aduz Pécaut, resulta de que, “na ausência de transformações sociais, os investimentos estrangeiros não têm mercado interno que possa atraí-los”. O ponto de Jaguaribe consiste em que nessa abertura se estabelece uma relação “colonial-fascista” entre os EUA e o Brasil, o que provocaria “uma redução da ajuda à economia brasileira e bloquearia o desenvolvimento autônomo e endógeno” (as expressões são do próprio Jaguaribe, cf. PÉCAUT, op. cit., p. 224). Pécaut assim sintetiza sua apresentação do primeiro tipo de pensamento: “esgotamento da substituição das importações”, “obstáculos ao desenvolvimento”, “contradições ‘explosivas’”: o conjuntural desaparece por trás do ‘estrutural’” (Ibidem, p. 225). O autor complementa esta sua proposição com observações de Albert O. Hirschman sobre os economistas, em texto de 1971. Pécaut anuncia a primeira desse modo: “A súbita mudança na apreensão das tendências econômicas não pode ser compreendida sem que se introduza a mediação nos modos de percepção. Na fase do desenvolvimentismo, os economistas subscreveram a visão de uma racionalidade sem falhas, concretizada no planejamento”. Outra observação de Hirschman é apresentada nestes termos: os economistas “alimentaram também esperanças de uma ‘homogeneização’ progressiva da sociedade à medida que avançasse o desenvolvimento. O próprio Celso Furtado anuncia que o Brasil havia ‘conseguido os seus centros de decisão e escapado da sua condição periférica’. A interpretação do desenvolvimento era indissociável dessa ideologia” (A última expressão entre aspas é de Hirschman, citado do texto de 1971). E assim: “Bastaria surgirem uma infla84 1964 – As armas da política e a ilusão armada