1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 83

O CONJUNTURAL DESAPARECE POR TRÁS DO ‘ESTRUTURAL’1 Raimundo Santos2 Discordantes sobre outros pontos, os intelectuais de oposição reconhecem, quase com unanimidade, que a ruptura política é o resultado do esgotamento do modelo de crescimento e que o governo militar, sob ortodoxia econômica, faz apenas uma tentativa de devolver a primazia aos setores tradicionais. Daí uma conclusão, ao mesmo tempo pessimista e otimista: o Brasil corre o risco de ser condenado à estagnação, mas o momento só pode ser um intervalo, já que o governo mergulha num impasse. O título e a epígrafe extraídos do livro de Daniel Pécaut, Os intelectuais e a política no Brasil. Entre o povo e a nação (1990), chamam a atenção para uma questão por demais atual nestes dias de inúmeros eventos relativos aos 50 anos do golpe de 1964. Trata-se da abstração da história política nas interpretações da destituição do presidente João Goulart, divulgadas nos anos seguintes a 1964. Os seus autores, intelectuais de oposição, viam a deposição de Jango – e a nova circunstância – como uma decorrência de processos estruturais. Nessa ótica, o governo reformista não passava de uma ilusão, tendo que chegar àquele desfecho, e o novo governo, por suas orientações recessivas, levaria a economia brasileira a dificuldades e contradições insalváveis, e não iria muito longe. A ocasião é oportuna para essa questão ser relembrada, pois hoje a luta democrática e a derrota do regime de 1964 são descritas 1 2 Este texto serviu de base para minha participação no debate “Regime militar e meio rural brasileiro”, CPDA/UFRRJ, 26/3/2014. Agradeço a Ana Lúcia Costa Silveira, professora do CTUR/UFRRJ, pelo apoio na sua preparação. Professor da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) e autor de vários livros, entre os quais Agraristas políticos brasileiros. Brasília: FAP-Nead, 2007. 81