1964 As armas da política e a ilusão armada | Page 60
responsáveis pelo bloqueio a qualquer saída – que quebrasse a
polarização extrema e oferecesse espaços de negociação em busca
de soluções para a crise – suportável ou possível nos marcos do
regime constitucional (como propôs San Tiago Dantas).
As forças políticas vitoriosas por meio do movimento político-militar trataram, desde a primeira hora, de mostrar a que
vinham: sustaram a democracia e desencadearam uma verdadeira
razia política (suspensão de direitos políticos, cassação de mandatos, intervenção em sindicatos e outras organizações, invasão e
depredação das sedes da UNE e do Iseb, inquéritos policial-militares, perseguições, prisões, assassinatos, tortura etc.). O regime
ditatorial, sob o invólucro militar, procurou legitimar-se autoproclamando-se “revolução” – apresentou-se como ruptura, como
algo novo; no entanto, o que fez foi reatualizar elementos pretéritos, modificados com novos componentes. Seu lema, “Segurança e
desenvolvimento”, nada mais era do que “a última metamorfose de
ordem e progresso” (IANNI, 1981, p. 201). Há ainda aqueles que
apontam similitudes entre a ditadura instaurada em 1964 e a ditadura estado-novista de 1937, uma atualizando a outra. Ou seja:
1964 teria vindo como que para confirmar 1937, não apenas pelo
registro coercitivo de suas instituições – o corporativismo sindical
do Estado Novo foi legitimado pelo regime militar, em que pese a
publicística ortodoxamente liberal da época de arregimentação de
forças pré-golpe –, mas sobretudo pela concepção de que os fins da
aceleração econômica deveriam prevalecer na ação dos aparelhos
do Estado. Os dois momentos fariam parte do processo de longa
duração da modernização conservadora brasileira, em que as elites
políticas se sobreporiam às elites econômicas, e promoveriam a
compatibilização entre os interesses modernos da indústria e do
ethos do industrialismo com as oligarquias agrárias tradicionais,
num contexto institucional de controles sociais repressivos sobre
as classes subalternas (VIANNA, 1994, p. 7).
58
1964 – As armas da política e a ilusão armada